A Criação

Todas as coisas têm um início no tempo e no espaço. Cada um de nós teve um início; as nossas casas, carros, naves, roupas, etc. tudo teve o seu momento inicial. Houve um tempo que estes corpos não existiam.
Pelo facto de estarmos cercados por coisas que tiveram início, somos tentados a concluir que tudo teve um início. Obviamente que tal conclusão pode nos conduzir a uma avaliação errada da realidade, e pode traduzir-se num salto no abismo do absurdo, visto que se esta conclusão fosse correcta, seria uma sentença de morte para a religião (e para a fé cristã), para a ciência e para a própria razão.
Afirmar que todas as coisas tiveram um início no tempo e no espaço, não significa que tudo teve um início, de maneira nenhuma. Em termos lógicos e científicos é simplesmente impossível que todas as coisas tenham um início, visto que, se tudo o que existe teve início, então teria havido um tempo em que nada existia.
Não se pode imaginar a existência do nada. Não podemos nem mesmo conceber a existência do absolutamente nada, já que o próprio conceito é a pura negação da existência de alguma coisa. O nada é diametralmente o oposto de alguma coisa.
Se houve tempo em que não havia nada, então hoje deveria continuar não haver algo, por uma simples razão de que, não se pode obter algo a partir do nada.
Uma lei absoluta da ciência e da lógica diz que ex nihilo nihil fit, quer dizer, “a partir do nada, nada procede”. O nada não pode produzir coisa alguma. O nada não possui nenhum poder porque não tem existência. Para que alguma coisa procedesse no nada, ela teria de possuir o poder de criação própria; teria de ser capaz de produzir a sua própria existência. Para que alguma coisa criasse ou produzisse a si próprio teria de ser antes de existir. Entretanto, se algo já existe, não tem a necessidade de ser criado.
Concluímos, pois, que se as coisas existem hoje, então de alguma maneira, em algum lugar, algo não teve início.
A famosa teoria de que o Universo é o resultado de uma ‘série infinita de causas finitas’ defendida por Bertrand Russell, pode negar a lei de que nada procede do nada, mas não pode refutá-la sem cometer suicídio mental. É preciso que tenha havido algo antes do começo temporal de tudo. O que ou Quem seria? Esta é a grande questão.
A Bíblia responde com a existência de um Ser Transcendente, isto é, alguém que está acima e além do Universo, alguém que deu início a tudo o que existe. Alguém que pertence a uma ordem mais elevada do que os outros seres. E esse ser é Deus, o Supremo Criador, que não teve início. Quando tudo começou, alguém esteve presente (Génesis 1:1). Este texto é fundamental para todo o pensamento cristão. “Antes que existisse algo, existiu alguém”. “No princípio…Deus”. Ele é a Causa não causada de tudo o que existe.
A obra da criação é da Santíssima Trindade: Pai, Filho e Espírito Santo (Génesis 1:1,2; Isaías 40: 13; João 1:3; I Coríntios 8:6; Colossenses 1:16). Deus fez tudo a partir do nada (Colossenses 1:17).


Textos de apoio: Génesis 1; Sal. 33:9; Salmos 104:24 – 26; Jeremias 10:1.16; Hebreus 11:3

(bases: Verdades Essenciais da Fé Cristã de R. C. Sproul; Grandes Doutrinas Bíblicas de Dr. Martyn Lloyd-Jones; Teologia Sistemática de George Eldon Ladd e Teologia Sistemática de Wayne Gruden).
estudo elaborado por: Pastor Samuel Quimputo

OS DECRETOS ETERNOS DE DEUS

Começamos os nossos estudos com a doutrina da Revelação nas suas diversas formas. Falamos do seu aspecto geral, assim como do específico. Abordámos a questão da Bíblia e da sua relação com a revelação especial de Deus. Analisámos os requisitos usados na elaboração do Cânon do Novo Testamento. Tratámos da questão da interpretação bíblica, sobretudo, no que diz respeito ao estudo pessoal das Escrituras. Abordámos as vantagens e as desvantagens (ou perigos) da interpretação demasiadamente individualista e subjectiva.
Passámos, depois, a analisar as doutrinas acerca de Deus, dos Seus atributos incomunicáveis e comunicáveis. Esperava-se que, depois da doutrina acerca de Deus, passássemos para a doutrina da Criação. Contudo, não teríamos uma compreensão mais abrangente sobre a Criação, sem antes focalizarmos a nossa atenção no complexo tema dos Decretos divinos.
Esta doutrina aborda a questão acerca de Deus, antes mesmo de ter criado algo, isto é, antes de Deus ter criado o mundo e o Homem. Houve um momento em que Ele ponderou, intentou e determinou certas coisas, assim como um projectista elabora o plano, antes de iniciar a obra.
Esta doutrina (difícil, mas fundamental) é frequentemente evitada. Contudo, somos recomendados a estudar e a expor a Bíblia na sua totalidade. É fundamental, visto que a Bíblia menciona a verdade de que “certas coisas foram decididas na mente e no conselho eternos de Deus, antes que Ele fizesse qualquer coisa no âmbito da Criação”.
Para entendermos o que a Bíblia ensina acerca desta grandiosa doutrina, devemos elaborar, com base bíblica, alguns princípios orientadores.
Salientamos, ainda, o facto de que, a dificuldade que encontramos quando estudamos algumas porções das Escrituras, não deve ser motivo para nos afastarmos delas ou de as ignorarmos, fazendo de contas que elas não existem.
Um dos grandes males (ou dificuldade) do cristianismo actual e da evangelização contemporânea é o facto de que, não dedicamos tempo suficiente com a doutrina a respeito de Deus. Este facto é de suma importância, visto que quanto mais conhecermos a verdade sobre Deus e a Sua infinita grandeza, mais a nossa alma sente a sua pequenez e se curva em adoração do grande e soberano Eu Sou.
As grandes doutrinas, tais como a Trindade, a Encarnação, ou o Nascimento Virginal revelam a nossa limitação e fraqueza mental. Estas verdades estão além da nossa capacidade de raciocínio, contudo, e por serem bíblicas, devem estimular-nos a nos sentirmos como crianças, dependentes do auxílio dos adultos. Vamos, então, com humildade e sem preconceitos, estudarmos o que a infalível Palavra de Deus nos ensina acerca desta augusta doutrina. Eis os princípios fundamentais (seguindo a sequência lógica sugerida por D. Martyn Lloyd-Jones):

1. Desde a eternidade Deus tem um plano imutável em relação às Suas criaturas (Efésios 1:4; Gálatas 4:4)
Significa que Deus jamais faz algo com indiferença; nada é incerto, acidental, casual ou fortuito em Suas actividades. Tudo o que Deus faz está de acordo com o Seu próprio plano eterno. Ele nunca perdeu o controlo sobre a obra de Suas mãos.

2. O plano de Deus abarca e determina todas as coisas e todos os eventos, de toda espécie, que acontecem.
Significa que, se Ele determinou certos fins, então Ele determina, também, tudo o que conduz a esses fins, isto é, os meios pelos quais os fins são atingidos. Isto inclui, necessariamente, as acções livres e voluntárias dos agentes livres e voluntários (Provérbios 16: 33; 21:1; Mateus 10: 29, 30; Efésios 1:10,11; 2:10; Filipenses 2:13).
Desse maneira, Deus governa, controla e determina os eventos que aparentam aos nossos olhos ser totalmente fortuitos (Provérbios 16:33).

3. As acções pecaminosas estão nas mãos de Deus e debaixo da Sua permissão.
Embora Deus não sejam o Autor ou a causa do mal, nem seja a origem do pecado, de modo algum, Ele, porém, “permite que os agentes perversos o realizem, e então o administra para Seus próprios fins sábios e santos”. Isto é, o mesmo decreto de Deus que ordena a Lei moral, que proíbe e pune o pecado, também permite a sua ocorrência. (Génesis 45: 8; 50: 20; Actos 2:23; 4:27,28). Há na vontade de Deus dois aspectos, distintos mas complementares, que são: o decretório e o permissivo. (a continuar)

4. Todos os decretos de Deus são incondicionais e soberanos.
Quer dizer que eles não dependem, em nenhum sentido, das acções humanas. Os decretos de Deus não são, de modo nenhum, determinados à luz do que Ele sabe que as pessoas irão fazer. Eles são absolutamente incondicionais e dependem, somente, da própria vontade e da própria santidade de Deus. Isto não significa que não exista a realidade de causa e efeito que se verificam na vida. Existem as chamadas acções condicionais ou causas secundárias.
O que a doutrina afirma, porém, é que cada causa e efeito, bem como as acções espontâneas, são componentes do decreto do próprio Deus. Quer dizer que Ele determinou agir daquela forma particular, com a fim de realizar a Sua santa vontade.
Deus decretou que o fim que Ele tem em vista será cumprido inevitavelmente, isto é, que nada poderá impedir o seu cumprimento, frustrá-lo ou mesmo questiona-lo (Daniel 4:35; Mateus 11: 25,26). A Sua vontade é soberana (Efésios 1:5). O Senhor sabe o que faz e fá-lo com toda a liberdade (Romanos 9:11, 13, 15-18).

5. Os decretos de Deus são eficazes.
Sendo Ele o Senhor soberano, necessariamente, e em virtude da Sua omnipotência e da Sua grandeza, os Seus propósitos jamais podem fracassar. Ele cumpre o que decretou. Ele realiza o que prometeu. O Seu plano será plenamente cumprido.

6. Os decretos de Deus são em todos os aspectos, perfeitamente consistentes com a Sua própria natureza sábia, benevolente e santa.
Isto, obviamente, significa que não há em Deus nenhuma contradição. Ele é perfeito e a Sua perfeição é absoluta. Nenhum aspecto da Sua natureza apresenta debilidade.
Apesar de existirem algumas contradições aparentes (isto é, paradoxais) em nossa mente finita, de uma coisa podemos estar certos e que devemos sempre ter em conta, é que Deus jamais é a causa do pecado. A Sua natureza é infinitamente pura e santa (Habacuque 1:13; Tiago 1:13).
É preciso salientar, também, que o propósito de Deus é, em todas as coisas, perfeitamente consistente com a natureza e o modo de agir das Suas criaturas. Há uma conciliação final entre os decretos de Deus e a existência de agentes livres e das acções livres.
Apesar de conceder liberdade às Suas criaturas, não obstante, Ele governa tudo a fim de que os Seus fins determinados possam ser concretizados.
A pergunta que se coloca, portanto, é: como pode Deus decretar tudo e ainda mantermo-nos responsáveis pelo que fazemos? Só existe uma resposta: Romanos 9:20-23. Mas, como podemos conciliar as duas realidades? Racionalmente não podemos. Contudo, está bem claro que a Bíblia afirma as duas coisas. Existe o Homem, como um agente livre, e, por sua vez, existe a verdade de que os decretos eternos de Deus governam todas as coisas, pois Ele é tudo em todos.

7. A salvação dos homens e das mulheres (e a preservação de alguns dos anjos) foi determinada por Deus antes da fundação do mundo.
Ele faz isso de acordo com o Seu beneplácito e com a Sua graça (Mateus 11: 25-26; João 6: 37, 44; Actos 13:48; 2 Tessalonicenses 2:13; 2 Timóteo 1:9).
A nossa tendência em racionalizar tudo (embora a própria razão não seja capaz de fazê-lo) leva-nos sempre a tentar encontrar explicações da parte de Deus acerca da lógica do funcionamento da nossa débil, enferma e limitada mente (Romanos 9:19). Muitos, na tentativa de encontrar uma justificação racional, que defenda a liberdade humana, chegam mesmo ao ponto de acusar Deus de injusto, como se esta atitude mudasse a natureza pura, santa e perfeita de Deus.
Contudo, a verdade bíblica afirma que, se somos filhos de Deus é por que Ele assim o determinou, e o que Ele determinou a nosso respeito é indiscutível, seguro e certo. Eis a razão da segurança que temos acerca da eficácia da nossa salvação. Se a nossa salvação não estiver inteiramente nas mãos de Deus, então, não podemos afirmar, com convicção, que somos filhos de Deus e que temos a vida eterna.
Temos que aceitar as verdades bíblicas com humildade, inundando os nossos corações com elevado senso de gratidão àquele que nos remiu e nos amou, antes mesmo de O termos conhecido (Romanos 5: 8-10), cujo Cordeiro, morto em nosso lugar, foi preparado antes da fundação do mundo (Apocalipse 13: 8; 17: 8).


(bases: Verdades Essenciais da Fé Cristã de R. C. Sproul; Grandes Doutrinas Bíblicas de Dr. Martyn Lloyd-Jones; Teologia Sistemática de George Eldon Ladd e Teologia Sistemática de Wayne Gruden).