A IMAGEM DE DEUS NO HOMEM

Depois de nos debruçarmos sobre a doutrina do Homem, onde abordámos questões tais como: a sua origem, a sua singularidade em relação ao resto da criação, a sua humanidade caracterizada pela consciência própria, pela liberdade moral, pela elaboração de pensamentos abstractos e pela capacidade de possuir religião e de prestar culto. Falámos, também, da sua perfeição original, assim como da unidade de toda a raça humana, confirmada pelas tradições comuns, tais como a Queda e o Dilúvio e pela Filologia, que desvenda as afinidades entre as línguas.
A constituição do ser humano é integral, embora haja evidências nas Escrituras sobre as diferentes partes que compõem a sua pessoa (1 Tessalonicenses 5 :23; Hebreus 4: 12).
Agora, passamos a abordar a importantíssima questão da Imagem de Deus implantada no Homem. Reflectiremos sobre as implicações no entendimento e na compreensão da Antropologia bíblica e na valorização da doutrina da Salvação (a Soteriologia).
A doutrina da Imagem de Deus no Homem é basilar para a compreensão de toda a Antropologia bíblica. “Não podemos explicar o mundo e o que estamos a fazer nele, a menos que estejamos esclarecidos sobre a nossa origem, a nossa natureza e o nosso ser essenciais”. Só um entendimento correcto sobre a imagem de Deus no Homem pode nos capacitar a discernir o ensino acerca da humanidade do Senhor Jesus e da Cristologia em geral. O que Ele fez por nós torna-se relevante em nossas mentes quando compreendemos a posição em que nos colocou, depois de termos sido salvos. E para isso, devemos desenvolver o interesse pela “psicologia bíblica”, visto que, toda verdade sobre a nossa salvação passa, necessariamente, pelo entendimento de quem é o Homem.
Assim, a primeira questão a ser abordada é a seguinte: Qual é o significado das expressões “imagem” e “semelhança”?
Em primeiro lugar, não há diferença real de significado entre “imagem” e “semelhança”. Ambos os termos são cambiáveis. Eles significam a mesma coisa, dependendo da ênfase que é dada no contexto em que aparecem.
Convém salientar que a questão da imagem de Deus no Homem revela a grandiosidade do Homem no plano da criação divina. É neste ponto que reside o grande erro da Humanidade, e de um modo particular, da Sociedade actual visto que, contraditoriamente, ao tentar exaltar o ser humano, rebaixa-o com a sua doutrina (a Teoria da Evolução). Esta Teoria é um insulto à grandeza e à dignidade que a Bíblia coloca sobre o Homem.
O termo “imagem” ou “semelhança” transmitem-nos a ideia de um espelho e de um reflexo (ex. 2 Coríntios 3:18). Sermos feitos à imagem de Deus significa sermos uma espécie de reflector de Deus, a saber, uma “espécie de reflector de algo da própria glória divina. Essa é a ideia essencial.
Em segundo lugar, convém notarmos que o termo “imagem” é usado antes e depois da Queda do Homem. Quer isto dizer que, a imagem de Deus no Homem não foi inteira e totalmente perdida quando Adão e Eva pecaram e caíram. Há teorias que defendem que a imagem foi perdida na queda e que, só mediante a redenção (pelo novo nascimento) é que ela é restituída.
Contudo, as Escrituras, como iremos provar, confirmam o contrário, e mostram que a posição do salvo é mais elevada em relação à do Homem, antes da queda.
É verdade o facto de que, quando o Homem caiu, perdeu algo da sua imagem. Entretanto, não perdeu toda a dimensão da mesma. Algo essencial à imagem ainda permanece.
Em terceiro lugar, é um engano definir a imagem original de Deus no Homem em termos do que nos é dito sobre o homem regenerado.
Este princípio esclarece a confusão que se gera quando se tenta equiparar a regeneração à imagem original implantada no Homem. O que aconteceu na regeneração não se restringe ao regresso ao estado original; ultrapassa a realidade anterior à queda (Romanos 5:20).
A salvação, a redenção e a regeneração colocam-nos a um nível superior e mais elevado do que o original em que se encontravam Adão e Eva.
Em Quarto lugar, há uma diferença entre o homem como criado no princípio por Deus e a natureza humana do Senhor Jesus Cristo. Esta diferença reside no facto de que, o Senhor Jesus é “a expressa imagem da pessoa de Deus”. Todo o brilho da glória divina encontra-se nele, realidade esta que não pode ser contemplada no homem.
Contudo, tendo em conta a verdade acerca da imagem divina no homem, podemos dizer que, ele é uma espécie de cópia criada. Cristo é a imagem real e essencial do próprio Deus.
Ainda no que diz respeito à imagem de Deus no homem, há dois elementos importantes a ter em conta: a imagem natural e a imagem espiritual. Isso pode ser definido da seguinte forma: “a imagem consiste da natureza intelectual e moral do homem, bem como da sua perfeição moral original”.
A sua natureza intelectual e moral constitui a sua imagem natural.
A sua perfeição moral original constitui a sua imagem espiritual. João Calvino afirmou que “a sede da imagem no homem é a alma, ainda que alguns raios dela brilhem igualmente no corpo”. Significa que, a imagem de Deus no homem, representa “a integridade original do homem, a sua unidade, a sua justiça e a sua rectidão”. Essa imagem “se estende a tudo o que há no homem e que excede a de todas as demais espécies de animais”. Esta imagem diferencia o homem de qualquer outra espécie do mundo animal – o seu aspecto espiritual.

Qual é, então, o significado da imagem com que o homem foi criado no princípio? O que significa essa semelhança de Deus em nós?
Antes de mais, ela refere-se à alma ou ao espírito, isto é, à nossa espiritualidade. Trata-se da nossa “invisibilidade” espiritual.
Em certo sentido, a essência do nosso ser é invisível. Ninguém é capaz de ver o que somos em termos do nosso ser essencial, nem nós próprios. A nossa percepção de nós próprios é deficiente pelo facto de que a nossa personalidade, o nosso ser essencial, é invisível, tal como a Pessoa de Deus (João 1:18). A nossa alma ou espírito é invisível.
Em segundo lugar, a imagem de Deus em nós refere-se à nossa “imortalidade”. Com imortalidade queremos dizer que a nossa alma (ou espírito) continua activa e consciente, mesmo depois da experiência da morte física. Nem mesmo a sua “morte” espiritual significa extinção ou inexistência. Significa, apenas, separação da presença graciosa do Deus que é a fonte da verdadeira vida.
De certa forma, por termos sido criados à imagem de Deus (como no início), fomos capacitados a viver por um tempo indeterminado.

Para além da invisibilidade e da imortalidade, a imagem refere-se às nossas capacidades e faculdades psicológicas (da alma). Aqui o interesse está em fenómenos psicológicos e não psíquicos.
Somos seres racionais e morais; quer dizer que possuímos intelecto e temos a capacidade de pensar; possuímos vontade e podemos desejar. A nossa capacidade de pensar e de desejar condiciona-nos a raciocinar, pensar, meditar e a desejar o que é eterno, ou seja, Deus (Eclesiastes 3:11).

Como imagem de Deus, também possuímos “auto consciência”. Temos consciência de nós mesmos. Possuímos auto consciência e reconhecemos a nossa incapacidade de fugir da nossa própria pessoa, do nosso próprio “eu”. De forma geral, como imagem de Deus, possuímos a “capacidade para a auto contemplação e de análise. Podemos nos contemplar a nós próprios e fazer uma auto análise. E quantas vezes não queremos exercer essa capacidade, chegando mesmo ao ponto de detestarmos o facto de sermos possuidores da mesma!
Outra característica da imagem de Deus no homem é a sua integridade intelectual e moral, que se revela no conhecimento, na justiça e na santidade. Esta realidade faz parte do ser humano, visto que ele foi criado intelectual e moralmente “de tal forma que havia uma espécie de integridade nele, sem falsidade, sem imperfeição e sem erro”. Havia nele rectidão, justiça e verdade. Ele foi preparado para ser íntegro moral e intelectualmente (Efésios 4: 24).

Textos de apoio: (Génesis 1: 26, 27; Génesis 5: 1,3; Génesis 9:6; Tiago 3:9; Efésios 4:24; Colossenses 3:10)

(bases: Verdades Essenciais da Fé Cristã de R.C.Sproul, Grandes Doutrinas Bíblicas de Dr. Martyn Lloyd-Jones, Teologia Sistemática de George Eldon Ladd, Teologia Sistemática de Wayne Gruden, Comentário de Génesis de Derek Kidner e A Terra…De Onde Veio de John C. Whitcomb)