A centralidade da Bíblia na experiência protestante

A Bíblia é a Palavra de Deus inspirada pelo Espírito Santo. Deus é o autor da Bíblia, homens inspirados escreveram-na (2 Tm 3.16). A Bíblia não é fruto da imaginação humana, mas da revelação divina. A Bíblia é a voz de Deus em linguagem humana. Como escreveu o apóstolo Pedro: “homens [santos] falaram da parte de Deus, movidos pelo Espírito Santo” (2 Pe 1.21). Por extensão, isto também se aplica aos escritos do Novo Testamento (2 Pe 3.15-16).


Toda a Bíblia é igualmente inspirada. Todas as palavras nas Escrituras são palavras de Deus (Nm 22.38; Dt 18.18-20; Jr 1.9; 14.14; 23.16-22; 29.31-32; Ez 2.7; 13.1-16), “de modo que não crer em alguma palavra da Bíblia ou desobedecer a ela é não crer em Deus ou desobedecer a ele” (Lc 24.25; Jo 15.20; 2Pe 3.2; 2Co 13.2-3; 1Co 14.38; Is 66.2). Todas as palavras nas Escrituras são inteiramente verdadeiras e não contêm erro em lugar algum (Nm 23.19; Sl 12.6; 119.89, 96; Pv 30.5; Mt 24.35). “Quando todos os factos forem conhecidos, demonstrarão que a Bíblia, nos autógrafos originais e corretamente interpretada, é inteiramente verdadeira, e nunca falsa, em tudo quanto afirma, quer no tocante à doutrina e à ética, quer no tocante às ciências sociais, físicas ou biológicas” (Grudem, 1999.52-55).


A Escritura é uma e não se contradiz. A Bíblia interpreta-se a si mesma (Lc 24.27, 1Co 2.13, 2 Pe 1.20). Encontra-se o significado da Bíblia na sua forma canónica e não em alguma fase reconstruída da sua história literária. Caso cheguemos a uma interpretação de uma passagem que contradiga uma verdade ensinada em algum outro lugar nas Escrituras, nossa interpretação pode não estar correta. A Escritura deve ser comparada com a Escritura a fim de descobrirmos o seu pleno significado. Não devemos forçar a Palavra de Deus para dizer o que queremos ouvir por causa das nossas pressuposições filosóficas, económicas, sociais e outras. 


A Escritura deve ser entendida no seu sentido literal, óbvio, gramático-histórico e teológico. A Bíblia, apesar de inspirada por Deus, foi escrita em linguagem humana (hebraico e grego) e dentro dos limites impostos por culturas igualmente humanas e, por isso, devemos entender essas culturas para interpretar os textos bíblicos de maneira adequada (Osborne, 2009:28,29). Contudo, ainda é correto afirmar que as verdades do evangelho são claras e de fácil entendimento (Dt 6.6-7; Sl 19.7; 119.130; Mt 12.3,5; 19.14; 22.29,31,42); porém, a tarefa de desvendar o significado original pretendido de textos específicos exige trabalho árduo (2Pe 3.15-16), bem como uma atitude moral e espiritual adequada (1Co 2.14; cf. 1.18-3.4; 2Co 3.14-16; 4.3-4, 6; Hb 5.14; Tg 1.5-6; 2Pe 3.5; cf. Mc 4.11-12; Jo 7.17; 8.43). 


A Bíblia é tudo de que precisamos para nos equipar para uma vida de fé e serviço. Este ensino é demonstrado nas palavras do apóstolo Paulo a Timóteo: “E que desde a tua meninice sabes as sagradas Escrituras, que podem fazer-te sábio para a salvação, pela fé que há em Cristo Jesus (2Tm 3.15, 2 Tm 1.5). De acordo com o contexto, as "sagradas Escrituras" aqui significam as palavras escritas da Bíblia (2Tm 3.16). 


As palavras de Deus que temos nas Escrituras são todas as palavras divinas que precisamos para a salvação: estas palavras podem tornar-nos sábios "para a salvação". Isto confirma-se por outras passagens que falam sobre as palavras das Escrituras como meio que Deus emprega para conduzir-nos à salvação (cf.: Tg 1.18; l Pe 1.23). Outras passagens indicam que a Escritura é suficiente para nos equipar para viver a vida cristã” (2 Tm 3.17; veja também Rm 15.4).


Portanto, a Bíblia é completa e suficiente para descobrirmos aquilo que Deus quer que pensemos e façamos. A Escritura “é a escola do Espírito Santo, na qual nem se deixou de colocar coisa alguma necessária e útil de se conhecer, nem tampouco se ensina mais do que é preciso saber” (Calvino, Institutas, III, 21.3). Deus não exige que creiamos em nada sobre si mesmo ou sobre sua obra redentora que não se encontre na Bíblia. Não devemos acrescentar proibições àquelas já afirmadas nas Escrituras. Deus nada exige de nós que não esteja determinado explícita ou implicitamente nas Escrituras (Grudem, 1999:87-93).


A Palavra de Deus, em forma Escrita é a nossa autoridade final - o padrão definitivo da verdade (Jo 17.17; 2Tm 3.16; 1Co 14.37; 2Pe 3.16). Somente Escritura (Sola Scriptura), e toda a Escritura (Tota Scriptura), é a autoridade absoluta e a norma suprema para aquilo que os fiéis e a Igreja devem crer e praticar. A autoridade da Bíblia encontra-se na autoridade de Deus. A Escritura é normativa (dá ordens, é a regra) para a nossa fé, a nossa vida, a nossa doutrina, a nossa reflexão teológica. A Escritura é o árbitro de todas as controvérsias. Ela é a “norma determinante” e não a “norma determinada” para todas as decisões de fé e vida. A Escritura deve ser o padrão supremo e fundamental da fé e da vida cristã. Outras escrituras, não canónicas, não podem servir de "fontes inspiradas”. A Bíblia não tem simplesmente uma opinião sobre as questões vitais que aborda, mas a verdade última, final e absoluta. Todas as convicções e práticas da Igreja deviam ser reavaliadas à luz das Escrituras.


A palavra pregada é central no culto cristão. A pregação da Palavra e a administração das ordenanças (o Batismo e a Ceia) são os meios oficialmente instituídos na igreja de Cristo, pelos quais o Espírito Santo produz e confirma a fé nos corações dos homens (Anglada, 2005:68-69). A pregação é o meio pelo qual as pessoas são externamente chamadas para a salvação (1Co 1.21). A pregação da palavra de Deus é a causa instrumental da fé e principal meio pelo qual a fé é aumentada e fortalecida, a igreja é edificada e o Reino de Deus é promovido no mundo (Rm 10.17). Pela pregação da Palavra a igreja é ensinada, convencida, reprovada, exortada e confortada (2Tm 3.16,17).


A Palavra de Deus é poderosa sempre, quer como sabor de vida para a vida, quer como sabor de morte para a morte (Cf.: 2Co 2.12-17), mas ela se torna eficaz na condução à fé e à conversão somente pela conjunta operação do Espírito Santo nos corações dos pecadores (Berkhof, 1990:602-618).


Pr Leonardo Cosme de Moraes


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Referências:

Anglada, Paulo. 2005. Introdução à pregação reformada: uma investigação histórica sobre o modelo bíblico-reformado de pregação. Pará: Knox Publicações.

Alexandre Júnior, M. 2010. Hermenêutica Bíblica. Lisboa: LBE.

Berkhof, L. 1990. Teologia Sistemática. Campinas: Luz Para o Caminho.

Calvino, J. 1985. As Institutas – ED Clássica, vol. III. São Paulo: Cultura Cristã.

Grudem, W. A. 1999. Teologia Sistemática: atual e exaustiva. São Paulo: Vida Nova.

Hasel, G. F. 1985. Biblical Interpretation Today. An Analysis of Modern Methods of Biblical Interpretation and proposals for the Interpretation of the Bible as the Word of God. Washington, DC: Biblical Research Institute.

Lopes, Hernandes Dias. 2004. A importância da pregação expositiva para o crescimento da igreja. São Paulo: Candeia.

MacArthur, John. 2010. Bíblia de Estudo MacArthur. São Paulo: SBB.

Osborne, G. R. 2009. A espiral hermenêutica: uma nova abordagem à interpretação bíblica. São Paulo: Vida Nova.

Robinson, Haddon. 2009. As convicções da pregação bíblica. (Em Robinson, Haddon & Larson, Craig Brian. Eds. A arte e o ofício da pregação bíblica. São Paulo: Shedd).

Taute, H. 2013. Curso Básico de Interpretação Bíblica. Stº Antão do Tojal: IBP-AEE.

VERDADES BÍBLICAS QUE NÃO PODEMOS ESQUECER

           

 

Hebreus 9.27-28


Este capítulo de Hebreus fala da imperfeição dos ritos, ofertas e sacrifícios da lei. Nele é enfatizado a perfeição, a suficiência e o carácter definitivo e superior do Sacrifício de Cristo. Porquanto o sacrifício de Cristo na Cruz providenciou uma eterna redenção (9.11,12); um sacrifício eficaz para sempre (9.26). Ao lermos os versículos 27 e 28, deparamo-nos com quatro verdades bíblicas que nunca devemos esquecer:


Aos homens está ordenado morrer uma vez (Hebreus 9.27a). Esta é uma regra geral para toda a humanidade. Ninguém pode fugir da morte. Só temos uma única vida para viver aqui na terra. A vida que vivemos sobre a terra em breve chegará ao fim (Sl 90.9). Como diz a Escritura: “O homem, nascido da mulher, é de poucos dias e farto de inquietação. Sai como a flor, e murcha; foge também como a sombra, e não permanece” (Jó 14.1-2). Vivemos num mundo onde todas as coisas são temporais e estão a morrer. Tudo sobre nós está morrendo, exceto nossa alma.


“Não sabemos o que acontecerá amanhã. A vossa vida é como um vapor que aparece por um pouco, e depois se desvanece” (Tg 4.14). Outrossim, “nada trouxemos para este mundo, e manifesto é que nada podemos levar dele” (1 Tm 6.7). Não há camiões de mudanças nos funerais (H. D. Lopes). Uma roupa selecionada para cobrir o corpo morto, um caixão, e uma sepultura, é tudo aquilo que o homem mais rico do mundo é capaz de ter com toda a sua riqueza (M. Henry). Por isso, busque mos em primeiro lugar o Reino de Deus (Mt 6.33). Busquemos as coisas lá do alto, pois o mundo e os seus desejos passam (1 Jo 2.17).


Há duas exceções bíblicas a esta regra universal: (a) As pessoas ressuscitadas que morreram duas vezes. No Antigo Testamento temos os casos do menino que Elias ressuscitou (1Reis 17.17-24), o menino que Eliseu ressuscitou (2Reis 4.32-37), e o caso de um homem que foi ressuscitado quando teve contacto com os ossos de Eliseu (2Reis 13.20-21). No Novo Testamento temos os casos de Lazaro (Jo 11.43-44); da filha de Jairo (Mt 9); do filho da Viúva de Naim (Lc 7), de Dorcas (At 9); e de Êutico (At 20.9-12). Por conseguinte, nenhum deles receberem um corpo glorioso e nem uma vida corpórea interminável. Portanto, morreram duas vezes. (b) Outra excepção são aqueles que não experimentaram a morte: Enoque (Gn 5.2) e Elias (2Rs 2.11); e aqueles que não experimentarão a morte: os crentes que estivem vivos na Segunda Vinda de Cristo, e que serão arrebatados a encontrar o Senhor nos ares, para estarem para sempre com o Senhor (1 Ts 4.17; 1Co 15.51-52).


A morte é uma consequência directa do pecado (Rm 5.12). Por causa do pecado de Adão, Deus pronunciou a sentença de morte sobre a raça humana (Gn 3.19). A Escritura afirma que a morte entrou no mundo após o pecado de Adão e Eva, não antes. “O salário do pecado é a morte, mas o dom gratuito de Deus é a vida eterna em Cristo Jesus, nosso Senhor.” (Rm 6.23).


Depois da morte vem o juízo (Hebreus 9.27b). A morte e o julgamento seguem-se um ao outro numa sequência lógica, porque o homem deve comparecer no tribunal de Deus para prestar contas de seus pecados. Portanto, cada pessoa tem apenas uma vida antes do julgamento eterno. Esta verdade bíblica repudia por completo (1) a teoria da reencarnação; (2) a crença de que a morte física é o fim da existência pessoal; (3) e qualquer ideia de que haverá uma segunda chance de mudança de status após a morte; como ensinam os defensores da teoria do purgatório.


No entanto, não há nada que você possa fazer para mudar o seu destino depois da morte. A vida curta que vivemos aqui definirá a eternidade. “Não há engano mais fatal do que pensar que se pode viver aqui como um ímpio e acordar na ressurreição como um santo. Estar sem Cristo nesta vida e passar a eternidade com ele.” (H. D. Lopes). Agora, portanto, é o tempo de voltar-se para Deus. Se você sair desse mundo sem pôr sua confiança em Cristo, descobrirá que melhor lhe fora nunca ter nascido.


O juízo aqui é um termo geral que inclui o julgamento de todas as pessoas, tanto cristãos (2Co 5.10, Rm 14.10-13) como incrédulos (Ap 20.11-15). A salvação é pela graça, mas a condenação no juízo final será segundo as obras de cada um. “Deus trará cada acto a julgamento, inclusive as coisas escondidas” (Ec 12.14). Seremos pesados na balança de Deus. Nossos pensamentos são contados, nossas palavras pesadas, nossas obras julgadas. 


Em Apocalipse 20.11-15, vemos uma descrição do Juízo Final. A partir do 12 lemos: “E vi os mortos, grandes e pequenos, que estavam diante de Deus, e abriram-se os livros; e abriu-se outro livro, que é o da vida. E os mortos foram julgados pelas coisas que estavam escritas nos livros, segundo as suas obras. 13 E deu o mar os mortos que nele havia; e a morte e o inferno deram os mortos que neles havia; e foram julgados cada um segundo as suas obras. 14 E a morte e o inferno foram lançados no lago de fogo. Esta é a segunda morte. 15 E aquele que não foi achado escrito no livro da vida foi lançado no lago de fogo”. Temos aqui uma advertência solene e que exige de todos uma resposta. Como proclamou o apóstolo Paulo dizendo: “No passado Deus não levou em conta a ignorância, mas agora ordena que todos, em todo lugar, se arrependam. Pois estabeleceu um dia em que há de julgar o mundo com justiça, por meio do homem que designou. E deu provas disso a todos, ressuscitando-o dentre os mortos” (At 17.30-31). Para onde você está indo? O caminho para o céu é Jesus Cristo. A porta do céu é Jesus Cristo. “E o inferno, onde fica? Fica no final de uma vida sem Cristo!” (H. D. Lopes).


Cristo foi sacrificado uma só vez para tirar os pecados (Hebreus 9.28). “O homem está destinado a morrer uma só vez” e “Cristo foi sacrificado uma só vez” (Hb 9.27-28). “Uma vez se manifestou, para aniquilar o pecado pelo sacrifício de si mesmo” (Hb 9.26). “Cristo morreu por nossos pecados, segundo as Escrituras” (1 Co 15.3). Ele levou em seu corpo os nossos pecados sobre o madeiro” (1Pe 2.24). 


Quando o Senhor Jesus Cristo morreu, carregou a plena penalidade do pecado do seu povo. O Pai aceitou-o completamente e, assim, Cristo está perpetuamente no céu. Ele representa-nos diante do Pai. Tudo que separa-nos de Deus já foi resolvido. Quando o substituto morreu em nosso lugar, todo o castigo que nosso pecado merecia recaiu sobre ele. Nada resta que tenha de ser pago. Não há oferta que ainda seja exigida. Tudo que tinha de ser feito, foi feito. O sacrifício de Cristo foi completo, suficiente, eficaz e definitivo. Sua ressurreição e a simples presença de Cristo no céu garante a nossa aceitação ali. Para aproximar-se de Deus, a única coisa que o pecador precisa fazer é confiar que seus pecados foram plenamente tratados na Cruz e que Deus aceitou aquilo que Cristo fez em seu favor.  Enquanto o Senhor Jesus Cristo estiver no céu, nenhum pecador que pela fé invoque o Seu nome poderá ser rejeitado! (Olyott). Como é grande o amor que foi derramado sobre nós! Quão grande é o acesso que temos!


Cristo aparecerá segunda vez, sem pecado, aos que esperam para a salvação (Hebreus 9.28b). No dia da expiação, o povo aguardava que o sumo-sacerdote saísse dos Santos dos Santos. Quando ele aparecia, o povo sabia que o sacrifício em seu nome havia sido aceito por Deus (MacArthur). Do mesmo modo, Cristo como o nosso Sumo-sacerdote, entrou no santuário celestial como o nosso mediador, e aparecerá em sua segunda vinda (At 1.11, 1Ts 2.19, 1 Jo 3.2), trazendo uma salvação plena e completa (Hb 1.14; Rm 8.18-23). Em 1Pe 1.3-5 fala de “uma herança incorruptível, incontaminável, e que não se pode murchar, guardada nos céus para aqueles que mediante a fé estão guardados na virtude de Deus para a salvação, já prestes para se revelar no último tempo. Esta vindicação será totalmente manifestada quando Ele vier novamente (1Ts 1.10).


Desta vez, entretanto, Jesus não aparecerá para tratar do pecado - para fazer expiação pelos pecadores. Quando ele vier novamente, ele trará vindicação (a salvação final) àqueles que estão esperando por ele. Cristo aparecerá “sem pecado” é uma expressão que testifica da obra completa de Cristo, por meio do seu sacrifício em sua primeira vinda. O pecado já foi derrotado por Jesus Cristo em sua primeira vinda! Como escreveu Calvino: “Cristo, em sua segunda vinda, dará a conhecer plenamente quão realmente ele destruiu os pecados, de modo que já não haverá necessidade de outro sacrifício para satisfazer a Deus. É como se ele estivesse dizendo que quando nos aproximarmos do tribunal de Cristo, descobriremos que em sua morte nada foi imperfeito.”


Devemos achar descanso no único sacrifício de Cristo. “Não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; porém, um que, como nós, em tudo foi tentado, mas sem pecado” (Hb 4.15). Nosso sumo sacerdote é “santo, inocente, imaculado, separado dos pecadores, e feito mais sublime do que os céus” (Hb 7.26). Ele “não cometeu pecado, nem na sua boca se achou engano” (1 Pe 2.22). Ele nasceu sem pecado, viveu sem pecado, venceu o pecado e morreu pelos nossos pecados.


Cristo aparecerá segunda vez. Ele em breve voltará. Como diz as Escrituras: “Eis que vem com as nuvens, e todo o olho o verá, até os mesmos que o traspassaram; e todas as tribos da terra se lamentarão sobre ele” (Ap 1.7). Ele mesmo prometeu e disse: “quando eu for, e vos preparar lugar, virei outra vez, e vos levarei para mim mesmo, para que onde eu estiver estejais vós também” (Jo 14.2). Em Atos 1.10-11, lemos que na acessão de Cristo os discípulos estavam “com os olhos fitos no céu, enquanto ele subia, quando junto deles se puseram dois homens vestidos de branco. Os quais lhes disseram: Homens galileus, por que estais olhando para o céu? Esse Jesus, que dentre vós foi recebido em cima no céu, há de vir assim como para o céu o vistes ir.”.


A Escritura ensina que todo cristão deve crer na possibilidade da volta de Jesus no seu tempo (2Pedro 3.4). A igreja primitiva acreditava na iminência da segunda vinda de Cristo: Fp 4.5 (“perto”); Tg 5.9 (“à Porta”); 1Pe 4.7 (próximo); Hb 10.25 (“se aproximando.”); Ap 3.11 (vem “sem demora.”); Ap 22.7 (“presto Venho.”); Ap 22.12 (“cedo venho”). Sem dúvida, sua vinda está mas próxima agora do que jamais esteve (Rm 13.11-14). Portanto, “… já é hora de despertarmos do sono; porque a nossa salvação está agora mais perto de nós do que quando aceitamos a fé…” (Rm 13.11).


A Escritura ensina que (1) a segunda vinda será imprevisível (1Ts 5.1-2). O tempo da segunda vinda é desconhecido da igreja (Mt 24.36). (2) A segunda vinda será repentina, como um ladrão de noite (Mt 24.42,43; 2Pe 3.10). O ladrão vem quando não é esperado e pega a família de surpresa. Será como no dilúvio (Mt 24.37), as pessoas vão estar cuidando dos seus próprios interesses: casando-se, e dando-se em casamento, comendo, bebendo. (3) A segunda vinda de Cristo é iminente. Por esse motivo advertiu-nos Jesus em Mateus 24.42: “Vigiai, pois, porque não sabeis a que hora há-de vir o vosso Senhor.” (4) A segunda vinda de Cristo põe fim a todas as esperanças de salvação. Não tem segunda chamada. Naquele dia a porta da oportunidade estará fechada. Naquele dia será tarde demais para se preparar (Mt 24.37-44).


Jesus aparecerá para aqueles que o aguardam. Cristo virá e nos levará. Porém, sem ele ninguém chegará ali. É melhor que aqueles que, como os hebreus, estiverem pensando em abandoná-lo lembrem-se bem disso. Suporte suas tribulações com paciência e fé. Olha para cima, pois sua redenção se aproxima. Em breve o Senhor enxugará dos seus olhos toda lágrima. Em breve a dor cessará. Há um descanso para o povo de Deus.


Somos instruídos a abandonar o estilo de vida ímpio e os prazeres pecaminosos, e a viver neste presente século sóbria, e justa, e piamente, aguardando a bem-aventurada esperança e o aparecimento da glória do grande Deus e nosso Salvador Jesus Cristo” (Tt 2.12-13). “A nossa cidade está nos céus, de onde também esperamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo, que transformará o nosso corpo abatido, para ser conforme o seu corpo glorioso, segundo o seu eficaz poder de sujeitar também a si todas as coisas” (Fp 3.20)”. 


Você está preparado para encontrar-se com Deus? A eternidade está a vir mui rapidamente sobre você. Você está indo muito rápido para ela. Mas onde você estará na eternidade? Você deseja ser salvo agora e por toda a eternidade? Então, renda-se a Cristo. Creia nele! A porta do céu está aberta. Ele tem vida eterna. A Escritura diz: Creia no Senhor Jesus e serás salvo (At 16.30,31). “Se com a tua boca confessares ao Senhor Jesus, e em teu coração creres que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo. Visto que com o coração se crê para a justiça, e com a boca se faz confissão para a salvação.” (Rm 10.9-10). Esta é uma decisão individual. Você precisa vir a Cristo para ser salvo! Só Nele há perdão e vida eterna. Hoje é dia de salvação. Venha enquanto a porta da graça está aberta. “Buscai ao Senhor enquanto se pode achar, invocai-o enquanto está perto. Deixe o ímpio o seu caminho, e o homem maligno os seus pensamentos, e se converta ao Senhor, que se compadecerá dele; torne para o nosso Deus, porque grandioso é em perdoar" (Is 55.6,7). 

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Referências:

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Calvino, J. 2012. Hebreus. São José dos Campos, SP: Editora FIEL (Hb 9.1-28).

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Guthrie, D. 1983. A Carta aos Hebreus: introdução e comentário. SP: Edições Vida Nova (Hb 9).

Henry, M. 2002. Comentário Bíblico de Matthew Henry. RJ: CPAD (Hb 9.1-28).

Kistemaker, S. 2013. Hebreus. 2a ed. SP: Editora Cultura Cristã.

Laubach, F., 2000. Comentário Esperança, Carta aos Hebreus. Curitiba: Editora Evangélica Esperança.

Lopes, H. D. 2018. Hebreus: a superioridade de Cristo. SP: Hagnos (Hb 9.1-28). 

Lopes, H. D. II Coríntios

MacArthur, J. 2010. Bíblia de Estudo MacArthur. SP: SBB, p.1701-1703. 

Michaels, R.J., 2009. Commentary on Hebrews. In Cornerstone Biblical Commentary: 1 Timothy, 2 Timothy, Titus, and Hebrews. Carol Stream, IL: Tyndale House Publishers, p. 408-409.

Moo, D.J., 2018. The Letters and Revelation. In Carson,  D. A., ed. NIV Biblical Theology Study Bible. Grand Rapids, MI: Zondervan, p. 2213-2214.

Olyott, S., 2012. A Carta aos Hebreus Bem Explicadinha: E Como Seu Ensinamento Se Desenvolve na Prática. SP: Editora Cultura Cristã.

Sproul, R.C. ed. 2015. The Reformation Study Bible: English Standard Version. Orlando, FL: Reformation Trust.

Wiersbe, W. W. 2006. Comentário Bíblico Expositivo, vl. 5. RJ: Central Gospel, p. 840-842. 




Pastor Leonardo Cosme de Moraes



ÉFESO, A IGREJA DO AMOR ESQUECIDO

         

 

Apocalipse 2.1-7


Éfeso era uma das quatro cidades mais poderosas do Império Romano (junto com Roma, Alexandria e Antioquia da Síria). Era a maior, mais rica, e mais importante cidade da Ásia Menor. Era o centro do culto à Diana, cujo templo era uma das sete maravilhas do mundo antigo. Era uma cidade mística, cheia de superstição e também um dos centros do culto ao imperador. Não apenas imperava na cidade o misticismo e a idolatria, mas também a perseguição implacável àqueles que buscavam ser fiéis a Deus. Também prevalecia na cidade a imoralidade associada aos cultos pagãos. 


Paulo visitou a cidade de Éfeso no final da segunda viagem missionária. Em sua terceira viagem, passou lá 3 anos (At 19.10). Deus realizou sinais e prodígios na cidade de Éfeso: (a) As pessoas ao ouvirem o evangelho denunciam publicamente as suas obras; b) As pessoas que se convertiam rompiam com o ocultismo, queimando seus livros mágicos. Paulo escreveu uma carta aos Efésios, agradecendo a Deus o profundo amor que havia na igreja (Ef 1.15). Timóteo é enviado para ser pastor da igreja. Mais tarde o apóstolo João pastoreia aquela igreja (1 Tm 1.3). Agora, depois de anos que a igreja fora fundada, na segunda geração de crentes, Jesus envia uma carta à igreja, mostrando que ela permanecia fiel na doutrina, mas já havia se esfriado em seu amor (Ap 2.1-7). Jesus tem uma mensagem para essa igreja e essa mensagem também é para nós.

O Senhor Jesus governa ativamente sua Igreja (2.1). Jesus tem todo o poder e autoridade sobre a igreja e seus líderes. A palavra anjos, no grego, significa mensageiros. Pode referir-se a mensageiros humanos, especificamente os pastores das igrejas, ou aos seres angelicais a serviço de Deus. A proeminência dos anjos no livro de Apocalipse apoiaria este último significado (22.6). Outros interpretes entendem que os anjos destas igrejas são personificações da identidade de cada igreja. Acontece, entretanto, que as sete estrelas são identificadas como o anjo de cada igreja (Ap 1.20). O anjo neste caso é um símbolo, e é definido pela Palavra de Deus como sendo um mensageiro (Hb 1.14). A estrela é usada para orientar e para guiar (Gn  1.16; Mt. 2.2). Portanto, estas estrelas que são os anjos das igrejas, representam seus pastores. Já os sete castiçais de ouro estão simbolizando as sete igrejas, que por sua vez englobam todas as igrejas do mundo (Ap 1.20). 


O Senhor Jesus faz elogios a sua Igreja (2.2-3,6). A igreja de Éfeso era ortodoxa, era uma igreja doutrinariamente pura e conservadora (2.2-3,6). A heresia não precedeu a ortodoxia como afirma a tese de Bauer-Ehrman. O próprio Novo Testamento já denunciava os desvios da doutrina original e apostólica. Um destes desvios fui o surgimento da doutrina dos Nicolaítas (Apocalípse 2.6, 12-17). Os Nicolaítas pregavam uma nova versão do Cristianismo. As práticas dos nicolaítas estavam ligadas a Balaão (2.14,15) e a Jezabel (2.20-23). Os pecados encontrados nestas duas figuras históricas são: idolatria, sincretismo e imoralidade. Parece que eles pregavam um evangelho sem exigências, libertino, sem proibições. Eles eram pessoas que se diziam crentes, mas não eram. Eles incentivavam os crentes a comer comidas sacrificadas aos ídolos. Eram imorais e ensinavam que a imoralidade não era pecado. Contudo, a igreja de Éfeso não tolerou a heresia e odiou as obras dos Nicolaítas (Ap 2.6). A Igreja de Éfeso, portanto, era uma igreja ortodoxa! 


A igreja de Éfeso era trabalhadora (2.2). O labor inclui trabalho físico e mental – ambos são normalmente difíceis e cansativos. E este texto mostra que Deus não se esquece dos combates de aflições dos seus servos Hebreus (6.10; 10.32). O facto de ter que se opor a homens maus, falsos apóstolos e nicolaítas na comunidade, sem dúvida alguma causava exaustão entre os membros da igreja de Éfeso. 


A igreja de Éfeso era perseverante nas tribulações (Ef 2.2-3). Hoje muitas igrejas preferem ser reconhecidas pelo mundo do que conhecidas no céu. Hoje muitos crentes querem a coroa sem a cruz. Querem a riqueza sem o trabalho. Querem a salvação sem conversão. Querem as bênçãos de Deus sem o Deus das bênçãos” (H. D. Lopes). Muitas igrejas preferem ser reconhecidas pelo mundo do que conhecidas no céu. 


O Senhor Jesus repreende sua igreja (2.4). A Igreja de Éfeso olhada de fora, era muito bonita. Aparentemente estava tudo bem. Mas nem tudo estava bem e de acordo com os parâmetros de Cristo, o Senhor e Rei que governa a igreja. Muitos estavam a abandonar o primeiro amor. A igreja de Éfeso é ortodoxa, trabalhadora, fiel nas provas, mas perdeu o calor da sua primeira experiência cristã. Esta igreja “é como uma esposa que não trai o marido, mas também não lhe devota amor” (Lopes). 


Em Éfeso havia fidelidade na doutrina, mas faltava amor na prática do Cristianismo. O zelo pela doutrina pura não pode nunca ser um substituto para o amor. A luta pela ortodoxia, o intenso trabalho, e as perseguições levaram a igreja de Éfeso à aridez. O amor é a marca do discípulo (João 13.34-35). Sem amor, nosso conhecimento, nossos dons, e nossa própria ortodoxia não têm nenhum valor (1 Coríntios 13.1-3). Odiar o erro e o mal não é o mesmo que amar a Cristo. O trabalho de Deus não pode tomar o lugar de Deus na nossa vida. 


A igreja de Éfeso examinava os outros e era capaz de identificar os falsos ensinos, mas não era capaz de examinar a si mesma. Tinha doutrina, mas não tinha amor. Identifica a heresia nos outros, mas não a frieza do amor em si. O primeiro amor havia esfriado e sido trocado por um rude zelo pela ortodoxia. Já não era um zelo motivado pelo amor a Deus e ao próximo (Mateus 23).


O Senhor Jesus ordena a sua igreja a recuperar o seu primeiro amor (2.5, 7). A igreja de Éfeso precisava recuperar o seu primeiro zelo, ternura e fervor. Eles deviam orar tão fervorosamente e vigiar tão diligentemente como quando entraram ao princípio nos caminhos de Deus. “Sempre que a presença da graça de Cristo for por nós descuidada, podemos esperar o seu desagrado” (Henry). 


Temos aqui conteúdo da ordem de Jesus para os que deixaram o primeiro amor: Lembra-te, arrepende-te e volta (2.5). Lembra-se da alegria da salvação. Arrependa-se de trabalhar sem amor. Volta a fazer como antes. Como nos melhores tempos da sua peregrinação espiritual com Cristo. 


Lembra-se de onde caíste volta à prática das primeiras obras. O Filho Pródigo começou o seu caminho de restauração quando lembrou-se da Casa do Pai; mas apenas lembrou-se da Casa do Pai. Ele voltou para a Casa do Pai. Lembrança sem mudança é remorso. Arrependimento não é emoção, é uma mudança radical de atitude. Arrepender-se é mudar a mente, é mudar a direção, é voltar-se para Deus. É deixar o pecado. É voltar a prática das primeiras obras, que são os frutos do arrependimento. Esta foi a diferença entre Pedro e Judas. Esta é a diferença que há entre crentes nominais e os que nasceram de novo. 


O Senhor Jesus faz uma solene advertência: “e, se não, venho a ti e tirarei do seu lugar o teu castiçal” (2.5). “O Castiçal é feito para iluminar. Se ele não ilumina, ele é inútil, desnecessário. A igreja não tem luz própria. Ela só reflete a luz de Cristo” (Lopes). Mas, se uma igreja não ama ela não brilha, porque quem não ama está nas trevas (1 Jo 2.9). A Escritura diz que o juízo começa pela Casa de Deus. Antes de julgar o mundo, Jesus julga a igreja (1Pe 4.17). Historicamente, a igreja de Éfeso deixou de existir. Seu castiçal foi removido. Hoje só existem ruínas e uma lembrança de uma igreja que perdeu o tempo da visitação do Senhor.

 

O Senhor Jesus faz promessas aos vencedores - “mas ao que vencer” (2.7). Cada uma das sete cartas termina com uma promessa ao vencedor. Uma promessa para aqueles obedecerem (ouvirem) o que o Espírito diz à igreja. Jesus fala em vitória porque estamos numa guerra espiritual. O vencedor alimenta-se da árvore da vida. Isto é, o vencedor é aquele que tem a vida eterna em Cristo Jesus (2.7). Muitos haviam abandonado o seu primeiro amor, mas os vencedores iriam morar no céu. Os que rejeitaram as comidas sacrificadas aos ídolos oferecida pelos Nicolaítas (Apocalipse 2.14-15; 2.20), irão alimentar-se da Arvore da Vida, no paraíso celestial. A paraíso de Deus é uma expressão figurada, tomada do relato do jardim, no Éden (Génesis 2.8), usada para falar do lugar onde Deus está. O Paraíso é mais do que um lugar, é um estado. Este é o Paraíso no Céu (2 Co 12.4).


Nota teológica: Todas as pessoas, ao morrerem salvas ou perdidas, continuam sob o controle soberano de Deus (Ec 12.7; Mt 10.28; Lc 23.46). Os salvos são levados para o Paraíso, no Céu (Fp 1.23; 2 Co 5.8; 1Pe 3.22). Os ímpios vão para o Hades (Hb. Sheol), um lugar de tormento (Sl 139.8; Pv 15.24; Sl 9.17 - cf. tb.: Lc 16.19-31; Lc 23.43; 2 Co 12.1-4; e Jo 14.1-6; Ap 6.9-11; 14.13). Entre a morte e a ressurreição do corpo (Jo 5.28, 29), a criatura humana encontra-se num estado intermediário. No entanto, o destino final e eterno do povo de Deus redimido será no “novo céu e a nova terra" (Ap 21.1); enquanto o lugar definitivo e eterno dos ímpios será no inferno (γέεννα, geenna - Mt 25.46; Mc 3.29; Hb 6.2; 2Ts 1.9; Jd 1.7). A Escritura ensina tanto a duração interminável dos sofrimentos penais dos perdidos quanto a “vida eterna” das bem-aventuranças dos salvos. As mesmas palavras gregas no Novo Testamento (aion, aionios, aídios) são usadas para expressar (1) a existência eterna de Deus (1Tm 1.17; Rm 1.20; 16.26); (2) de Cristo (Ap 1.18); (3) do Espírito Santo (Hb 9.14); e (4) a duração eterna dos sofrimentos dos perdidos (Mt 25.46; Jd 1.6). O tormento final dos ímpios é descrito nos seguintes termos: “Fogo que não se apaga” (Mc 9.45, 46); “fogo inextinguível” (Lc 3.17); “o verme que nunca morre”; “o poço sem fundo” (Ap 9.1); “a fumaça do seu tormento subindo para todo o sempre” (Ap 14.10, 11). Portanto, a “segunda morte” (Ap 20.14) é representada como um futuro sofrimento consciente que dura para sempre. Por outro lado, a “vida eterna” é representada como um estado de felicidade suprema e indiscritível, na presença de Deus, numa nova realidade cósmica redimida (Ap 21.3,4).


A mensagem enviada à igreja de Éfeso é uma palavra viva e actual para a igreja hoje. Os problemas que aquela igreja enfrentou são os problemas que enfrentamos hoje. O Senhor Jesus anda no meio da sua igreja (2.1). Aquele cujos os olhos é como chama de fogo está a ver-nos (2.18). O que ele está vendo? Que elogios ou exortações ele tem para nós? Que mudanças precisamos fazer? Ouça o que o Espírito diz a esta igreja!


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Referências: 

Andrade, C. 2016. Os sete castiçais de ouro. RJ: CPAD.

Ashcraft, Morris. 1987. Apocalipse. (Em Allen, Clifton J., ed. 1987. Comentário Bíblico Broadman: Novo Testamento. 2º ed. RJ: Junta de Educação Religiosa e Publicações).

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Easton, M.G. 1893. Easton’s Bible Dictionary.

Henry, M. 2002. Comentário Bíblico de Matthew Henry. RJ: CPAD (Ap 2.5).

Kistemaker, S., 2014. Apocalipse. 2a ed. SP: Editora Cultura Cristã (Ap 2.1-7).

Lopes, H. D. 2005. Apocalipse/o futuro chegou, as coisas que em breve devem acontecer. SP: Hagnos (2.1-7).

Ladd, G. 1980. Apocalipse: introdução e comentário. SP: Vida Nova (Ap 2.1-7).

Sproul, R.C. org., 2015. The Reformation Study Bible: English Standard Version (2015 Edition), Orlando, FL: Reformation Trust (Ap 2.1-7).

Exposição de Cânticos dos Cânticos 2.7

 



NOTA EXEGÉTICA

Cântico dos Cânticos 2.7


Texto: הִשְׁבַּעְתִּי אֶתְכֶם בְּנוֹת יְרוּשָׁלִַם בִּצְבָאוֹת אוֹ בְּאַיְלוֹת הַשָּׂדֶה אִם־תָּעִירוּ וְאִם־תְּעוֹרְרוּ אֶת־הָאַהֲבָה עַד שֶׁתֶּחְפָּץ 

             (Cântico dos Cânticos de Salomão 2.7, Bíblia Hebraica Stuttgartensia).


Análise

Aqui temos uma típica fórmula hebraica de juramento negativo em que o falante exorta seu público a fazer um voto de não fazer algo que teria consequências destrutivas: A expressão הִשְׁבַּעְתִּי (hishba'ti, “Conjuro-vos”) é usado quando um orador exorta seu público a fazer um juramento.


Frequentemente, quando os juramentos eram feitos no mundo antigo, testemunhas eram invocadas para solenizar o voto e agir como juristas, caso o juramento algum dia fosse quebrado. Neste caso, as “testemunhas” são as “gazelas e cervas do campo” (2.7; 3.5). Estes animais eram frequentemente usados ​​como símbolos de amor romântico no AT (Pv 5.19). Assim, as “gazelas” e “cervas do campo (ou selvagens)” seriam zoomorfismos para o amor personificado. Noutras palavras, o testemunho deste juramento é o próprio “amor”. Se as filhas violarem este voto que são solicitadas a fazer, o próprio “amor” as responsabilizará. Alguns especialistas na língua hebraica (como Sheri L. Klouda), destacam que a palavra para ‘gazelas’ é semelhante à palavra hebraica tseva’ot (בִּצְבָאוֹת), ’exércitos’, que era usada na identificação tradicional ‘Yahweh (יהוה = YHWH) dos exércitos’. Caso seja uma imitação intencional de uma invocação divina, esta seria uma paráfrase para evitar jurar em nome do Senhor.


Os termos ָתּעִירוּ (ta'iru, "despertar"; imperativo Hiphil de עוּר) e תְּעוֹרְרוּ (té'oréru, "provocar"; Polel imperativo de עוּר) são provavelmente expressões figurativas (hipocatástase) em vez de literais, porque o objeto não refere-se a uma pessoa (o amante), mas a um estado emocional (“amor”). Estas expressões traçam uma comparação implícita entre a ação literal de despertar uma pessoa do sono e provocá-la à uma ação estimulada, com a imagem figurativa dum amante despertando e provocando o desejo sexual de sua amada. Portanto, a tradução proposta pela Nova Versão Internacional corresponde perfeitamente ao sentido do texto na língua hebraica: “não despertem nem provoquem o amor enquanto ele não o quiser” (2.7). A versão Almeida Século 21 vai no mesmo sentido: “não acordeis nem provoqueis o amor até que ele o queira” (2.7)


A função sintática do artigo sobre הָאַהֲבָה (ha’ahavah, "amor") é debatida. A razão disso pôde ser parcialmente sentida na aula desta manhã (Domingo, 11/10/20). A maioria das traduções entende a função do artigo sobre ha’ahavah (“amor”) como um artigo que denota um conceito abstrato. No entanto, algumas traduções (por exemplo: KJV, BPT, RCF, JB, NEB), vêem-no como um uso abstrato do artigo para o concreto, e o traduzem como "meu amor", referindo-se tanto aos próprios sentimentos da mulher quanto aos sentimentos de seu amante. Ao longo de Cântico dos Cânticos, o termo אַהֲבָה ('ahavah, "amor") não é usado como um termo afetuoso em referência a um dos amantes; normalmente refere-se ao amor físico/sexual (Cântico 2.4, 5, 7; 3.5; 5.4; 8.4, 6, 7). A referência ao desejo sexual em 2.4-5, e חוֹלַת אַהֲבָה (kholat ’ahavah, "doente de amor”) em 2.5, sugere que o uso de אַהֲבָה ("amor") em 2.7 é desejo sexual.


Comparação de traduções portuguesas

Leia abaixo as versões de Cantares 2.7 e atente para as diferenças sintáticas, “meu amor/amado”, no lado esquerdo do quadro, e “o amor”, no lado direito. As traduções portuguesas versam o texto hebraico das duas formas. Tomei nota destas diferenças durante a aula desta manhã, mas era impossível dar uma resposta adequada e técnica sem verificar o texto na língua original.   


Ó filhas de Jerusalém, conjuro-vos, pelas gazelas e cervas dos bosques, que não acordem o meu amado. Deixem-no dormir! (BPT)

Mulheres de Jerusalém, eu as faço jurar pelas gazelas e pelas corças do campo: não despertem nem provoquem o amor enquanto ele não o quiser (NVI)


Conjuro-vos, ó filhas de Jerusalém, pelas gazelas e cervas do campo, que não desperteis e nem acordeis o meu amor, até que ele queira (KJF)


Ó filhas de Jerusalém, pelas corças e gazelas do campo eu vos conjuro: não desperteis, não acordeis o amor, até que ele o queira! (KJA). 

Conjuro-vos, ó filhas de Jerusalém, pelas gazelas e cervas do campo, que não acordeis nem desperteis o meu amor, até que queira. (RC). 

Conjuro-vos, ó filhas de Jerusalém, pelas gazelas e cervas do campo, que não acordeis, nem desperteis o amor, até que este o queira (ARA)

Moças de Jerusalém, eu proíbo, pelas gazelas e cervas do campo, que vocês acordem o meu amado. Deixem que ele durma! (BV)

Mulheres de Jerusalém, eu as faço jurar pelas gazelas e pelas corças do campo: não despertem nem provoquem o amor enquanto ele não o quiser (NVT). 



Comentário simplificado

- A expressão deste verso (Cantares 2.7) reaparece em 3.5 e 8.4. Cada refrão segue uma descrição da consumação da relação conjugal. À luz da natureza consumidora do amor, conforme descrito em 2.3-6, a esposa procurou desencorajar as jovens de evolverem-se prematuramente num relacionamento sexual. A admoestação promove a castidade e o autocontrole. Portanto, temos neste refrão um lembrete de que o acto sexual deve aguardar o momento certo com a pessoa certa. O contexto mais amplo das Escrituras indica que o momento certo é o casamento, e a pessoa certa é seu cônjuge.

- Por mais atraente que seja o amor, ele não deve ser forçado ou apressado, daí a conjuração da mulher às filhas neste versículo. É claro que o casal já está apaixonado, mas deve permitir que seu amor prossiga em seu ritmo adequado, o que inclui esperar até o momento certo para consumá-lo (no casamento).


Análise teológica  

  • A Bíblia não condena o sexo, apenas o sexo pervertido (1 Coríntios 6.18; Gálatas 5.19). Deus criou o sexo (Gn 1.27) e ordenou que fosse desfrutado dentro dos limites do casamento monogâmico e sob um relacionamento de amor (confira Provérbios 5.18-19).
  • Depois de advertir àqueles que proíbem o casamento (1 Timóteo 4.3), o apóstolo declara que "tudo que Deus criou é bom" (4.4), e prossegue falando do Deus "que tudo nos proporciona ricamente para nosso aprazimento" (6.17). O livro de Hebreus destaca que "digno de honra entre todos seja o matrimônio, bem como o leito sem mácula; porque Deus julgará os impuros e adúlteros" (Hb 13.4).
  • Deus tem consciência de que as pessoas normais têm desejos sexuais, mas ele acrescenta: "mas, por causa da impureza, cada um tenha a sua própria esposa, e cada uma, o seu próprio marido" (1 Coríntios 7.2). Assim, o sexo em si não é pecado, assim como os desejos sexuais também não o são. Deus os criou com a pretensão de que fossem desfrutados dentro dos laços de amor de um casamento monogâmico. O Cântico dos Cânticos de Salomão é um exemplo de como o amor conjugal deve expressar-se no casamento, dado com a autoridade divina.


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Apêndice: Alguém mencionou a expressão “harém de Salomão” e apercebi-me da necessidade de fazer um esclarecimento adicional.


Estimados irmãosapenas porque a Bíblia relata o pecado de poligamia praticado por Salomão, não significa que Deus a aprove. 


Não seria necessário comentar Cantares 6.8, uma vez que o versículo 9 já resolve a questão com relativa clareza. Todavia, se este texto faz referência directa ao Rei Salomão, então temos aqui um tópico que exige-nos estudo detalhado. 


O livro Cântico dos Cânticos menciona “sessenta rainhas, oitenta concubinas (= esposas secundárias) e incontáveis virgens" (Cantares 6.8) como parte do “harém de Salomão”. Posteriormente, conforme lemos em 1 Reis 11.1, este número aumentou. A pergunta que se faz é a seguinte: por que Deus permitiu que Salomão tivesse tantas mulheres, se ele condena a poligamia?


A monogamia é o padrão de Deus para os homens. Isto está claro pelos seguintes factos: (1) Desde o princípio Deus estabeleceu este padrão ao criar o relacionamento monogâmico de um homem com uma mulher, Adão e Eva (Génesis 1.27; 2.21-25). (2) Esta ficou sendo a prática geral da raça humana (Génesis 4.1), seguindo o exemplo estabelecido por Deus, até que o pecado a interrompeu (Génesis 4.23). (3) A Lei de Moisés claramente ordena: "Tampouco para si multiplicará mulheres" (Deuteronómio 17.17). (4) A advertência contra a poligamia é repetida na própria passagem que dá o número das muitas mulheres de Salomão (1 Reis 11.2): "Não caseis com elas, nem casem elas convosco". (5) Jesus reafirmou a intenção original de Deus ao citar esta passagem (Mateus 19.4) e ao observar que Deus "os fez homem e mulher" e os juntou em casamento. (6) O NT enfatiza que "cada um tenha a sua própria esposa, e cada uma, o seu próprio marido" (1 Coríntios 7.2). (7) De igual forma, Paulo insistiu que o líder da igreja deveria ser "esposo de uma só mulher" (1 Timóteo 3.2; 12). (8) Na verdade, o casamento monogâmico é uma prefiguração do relacionamento entre Cristo e sua noiva, a Igreja (Efésios 5.31-32).


A poligamia nunca foi estabelecida por Deus para nenhum povo, sob circunstância alguma. De facto, a Bíblia revela que Deus puniu severamente aqueles que a praticaram, como se pode ver pelo seguinte (Geisler): (1) A primeira referência à poligamia ocorreu no contexto de uma sociedade pecadora em rebelião contra Deus, na qual o assassino “Lameque tomou para si duas esposas" (Génesis 4.19,23). (2) Deus repetidamente advertiu ou polígamos quanto às consequências de seus atos: “para que o seu coração se não desvie" de Deus (Deuteronómio 17.17; cf. 1 Reis 11.2). (3) Deus nunca ordenou a poligamia como o divórcio, ele somente a permitiu por causa da dureza do coração do homem (Deuteronómio 24.1; Mateus 19.8). (4) Todo praticante da poligamia na Bíblia, incluindo Davi e Salomão (1 Crónicas 14.3), pagou um alto preço por seu pecado. (5) Deus odeia a poligamia, assim como o divórcio, porque ela destrói o seu ideal para a família (Malaquias 2.16).


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Referências:

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Anon, 2017. The Lexham Analytical Lexicon of the Hebrew Bible.

Biblical Studies Press, 2006. The NET Bible First Edition Notes. Biblical Studies Press.

Barry, J.D. et al., 2012, 2016. Faithlife Study Bible. Bellingham, WA: Lexham Press.

Carson, D.A. org., 2018. NIV Biblical Theology Study Bible, Grand Rapids, MI: Zondervan.

Crossway Bibles, 2008. The ESV Study Bible. Wheaton, IL: Crossway Bibles.

Geisler, N. L., ed. 1999. Manual popular de dúvidas, enigmas e “contradições” da Bíblia. SP: Mundo Cristão.

Murphy, R.E., 1990. The Song of Songs: a commentary on the Book of Canticles or the Song of Songs S. D. McBride, org., Minneapolis, MN: Fortress Press.

Sproul, R.C. org., 2015. The Reformation Study Bible: English Standard Version (2015 Edition), Orlando, FL: Reformation Trust.

Strong, J., 2002. Léxico Hebraico, Aramaico e Grego de Strong.

Waltke, B.K. & O’Connor, M., 2006. Introdução à Sintaxe do Hebraico Bíblico 1a edição., São Paulo, SP: Editora Cultura Cristã.

Whitaker, R. et al., 1906. The Abridged Brown-Driver-Briggs Hebrew-English Lexicon of the Old Testament: from A Hebrew and English Lexicon of the Old Testament by Francis Brown, S.R. Driver and Charles Briggs, based on the lexicon of Wilhelm Gesenius.


Pr Pastor Cosme de Moraes