O Segundo Mandamento: nenhuma imagem de Deus

O Segundo Mandamento: nenhuma imagem de Deus - Êx 20.4-6; Dt 5.8-10 

O segundo mandamento proíbe a adoração a Deus através de imagens (Deuteronómio 4.15-16) ou qualquer outro modo que não está mostrado na Sua Palavra (Colossenses 2.18). O segundo mandamento exige receber, observar (Deuteronômio 32.56) e manter puros e completos toda a adoração religiosa e ordenanças como Deus mostrou em sua Palavra (Deuteronómio 12.32). 

A proibição “não farás para ti” implica que esses deuses existem apenas na nas mentes de adoradores. O mandamento contra fazer quaisquer imagens pertence inseparavelmente ao mandamento de não se curvar a elas. A preocupação deste mandamento é a adoração de Deus não como imaginado, mas como revelado. Conforme João 4.24, “em espírito e em verdade”; não pelo apelo estético ou intelectual do artificial, mas em resposta ao Espírito e à Palavra de Deus. Deuteronômio 4.12-40 salienta a invisibilidade de Deus; Isaías 40.18-26; 44.9-21, expõe o lado farsante da idolatria. 

As consequências de quebrar esse mandamento são que Deus visita a iniquidade dos pais nos filhos, netos e bisnetos. Isso quer dizer que o castigo é dirigido ao pai para que, em vida, veja os desdobramentos de seu pecado na vida de seus descendentes. No entanto, parece que a ideia de castigar os filhos pelos pecados do pai contradiz Ezequiel 18.20: “Aquele que pecar, esse morrerá; o filho não levará a culpa do pai, nem o pai levará a culpa do filho. A justiça do justo estará sobre ele, e a impiedade do ímpio cairá sobre ele” (cf. Dt 24.16). Todo o capítulo 18 de Ezequiel trata da questão; “Por que Deus nos castiga (a nós que estamos no exílio) pelos pecados de nossos pais?”. A resposta de Ezequiel é que Deus não castiga os filhos pelos pecados dos pais. A resposta está na expressão “daqueles que me rejeitam”. Este mandamento leva em conta a realidade da natureza humana. Os filhos tendem a crescer nos pecados de seus genitores, pois copiam as atitudes e o comportamento deles. É evidente, portanto, que o castigo divino somente recai sobre a linhagem que continua o pecado do pai. Deus visita o pecado dos filhos tanto pelo pecado deles próprios quanto para mostrar ao pai as consequências das ações deste. Apesar disso, a graça é inerente a esse castigo. A apostasia é transmitida até a terceira e a quarta geração. Em contraste com isso, Deus não interrompe o processo em que a fé é transmitida ao longo das gerações. Ele promete agir com “fidelidade de aliança” até a milésima geração daqueles que o amam. “Até mil gerações” (ARA) é uma metáfora para a bondade e a graça eternas.

A justificação apresentada para os dois primeiros mandamentos é: “Eu, Eu Sou teu Deus, sou Deus zeloso”. No Velho Testamento, a palavra traduzida por “zeloso” possui dois sentidos: “um forte apego ao que é seu” e “um forte desejo de ter o que é de outrem”. O primeiro sentido é correto e saudável; o segundo é errado. O primeiro traz a ideia de “ciúme”; o segundo, de inveja. 

Hoje em dia, é comum a palavra “ciúme” ter a conotação de um receio irracional e paranoico. E a maneira de sentir daquela pessoa que vive com medo de não ter plena posse do que lhe pertence - percepção que não corresponde à realidade. Apesar disso, também existe o “ciúme saudável”: se um dos cônjuges trai o outro, o cônjuge traído terá um ciúme natural e justificado. Caso não tenha essa reação diante da infidelidade, podemos pressupor que ele não ama de verdade a pessoa que o está traindo. De modo semelhante, Deus demonstra um ciúme saudável no zelo que tem por seu povo. Ele importa-se com seus bens pessoais. Quando esses bens são entregues a outra divindade, ele reage de modo veemente (1Co 10.22; Tg 4.5). 

O segundo mandamento não é contra as artes. Parece inconsistente que Deus proíba a “semelhança” de qualquer coisa da criação e em seguida ordene que Moisés modele seres celestes. Mas essas imagens foram ordenadas como parte da Arca da Aliança (os querubins, Êx 25.17-20), dos cálices do candelabro, os quais deveriam ter a forma de hastes, botões e flores de amendoeira (Êx 25.31-34), e assim por diante. O restante da Bíblia está repleto de arte. O templo de Salomão continha várias representações da natureza: romãs (I Rs 7.18), touros (1 Rs 7.25), querubins, leões, palmeiras (I Rs 7.36) e outros. Ou seja, na época do rei Salomão Israel não entendia o segundo mandamento como proibição à arte. Nenhum profeta condenou os israelitas por envolverem-se na criação artística. 

A dificuldade encontra-se na realidade da natureza humana. A natureza depravada da humanidade anseia por um deus que possamos ver. Por esse motivo, a confecção de estátuas que representam a Deus ou de ícones pode levar alguns a adorá-las, em vez de adorar a divindade que representam, ou a manipular as estátuas e os ícones como forma de aproximar-se de Deus. O segundo mandamento evidentemente proíbe essas práticas idólatras. Consequentemente os cristãos vivem numa tensão. A arte é permitida, mas pode ser perigosa. Precisamos repensar as questões da relação entre cristianismo e as artes, sem deixar que o zelo religioso cegue-nos. 

Pastor Leonardo Moraes
Boletim Dominical 41/23
26 nov 2023