Igreja que Ora


Atos 12 retorna a Jerusalém onde encontramos uma nova perseguição contra os líderes cristãos, os apóstolos (12.1-4). Herodes Agripa I, que nesta altura governava sobre a Judeia, Samaria, Galiléia, Transjordânia e Decápolis, fazia o que fosse necessário para agradar os judeus. Enquanto Herodes, o Grande, viva constantemente em conflito com os judeus, Herodes Agripa I sabia como obter o favor dos líderes e dos principais sacerdotes e, por essa razão, contava com o apoio deles.

 

Graças a essa política, ele mandou […] prender alguns da igreja para os maltratar e fez passar a fio da espada o apóstolo Tiago, irmão de João, e filho de Zebedeu (Lc 5.10; 6.14; 8.51; 9.28). A população aprovou a perseguição contra os líderes da igreja, então Herodes decidiu ir atrás de Pedro. Herodes prendeu Pedro com o propósito de matá-lo após os sete dias da Festa da Páscoa, com o único propósito de agradar os judeus (12.3). Ele queria dar um golpe mortal na igreja matando seus principais líderes. 

 

Todas as precauções foram tomadas para que Pedro não escapasse  da prisão. Herodes enviou quatro esquadrões de soldados para guardá-lo até que pudesse ser executado (12. 6, 10). Havia quatro esquadrões porque cada um era dividido em quatro turnos. Isso significa que havia quatro grupos de quatro – 16 soldados romanos – vigiando Pedro na prisão. Dois soldados ficavam com ele em sua cela. Pedro tinha cada perna acorrentada a um guarda, enquanto os outros dois guardas vigiavam os portões externos. 


Quando Tiago foi executado, os crentes não se desesperançaram com a oração. Em seguida ficou pior, mas os cristãos não abandonaram a oração. Eles oraram ainda mais fervorosamente. Do ponto de vista humano, só um milagre poderia livrar o apóstolo da morte. Eram os dias da Festa da Páscoa. Durante todo o tempo que Pedro esteve na prisão a igreja permaneceu em oração (12.5).


Deus poupou Pedro, mas permitiu que Tiago fosse morto. Tiago morreu pela causa de Deus, assim como seu Senhor (Mc 10.36-39). A vontade do Senhor é sempre sábia e boa, mas nem sempre é previsível. Nós não vemos tudo que Deus vê! Precisamos confiar em Deus, e que Ele nos ajudará a usar o sofrimento em prol do nosso fortalecimento, e ao mesmo tempo para Sua glória. Precisamos dizer como Paulo: “Por que, se vivemos, para o Senhor vivemos, se morremos, para o Senhor morremos. Quer, pois, vivamos ou morramos, somos do Senhor” (Rm 14.8). Uns são libertos pela fé; outros morrem pela fé. Na galeria da fé, em Hebreus 11, uns foram libertos do fogo e da boca de leões pela fé; outros, pela fé, foram mortos e serrados ao meio. Deus é Deus quando nos livra da morte e quando nos leva para sua presença. Ele é Deus quando atende a nossa oração curando e quando chama-nos para a sua presença. 

 

Este episódio sublinha diferentes princípios relativamente à prática da oração na vida da igreja:


A igreja que ora recebe prontamente o auxílio do céu (12.5-11). Na mesma noite em que Herodes planeava apresentá-lo […], Pedro dormia sono profundo, mesmo algemado entre dois soldados (12.6). Ele confiava em Deus. Ele podia dizer, assim como Paulo escreveu quando também esteve preso: “para mim, o viver é Cristo, e o morrer é lucro” (Fl 1.21).

 

Lucas informa que, de repente, um anjo do Senhor apareceu, e a cela encheu-se de luz. O anjo tocou o lado de Pedro e ordenou que ele se levantasse depressa. No mesmo instante, as algemas caíram das suas mãos. Então o anjo disse a Pedro que se vestisse, calçasse as sandálias, pusesse a capa e o seguisse. Mesmo confuso, Pedro obedeceu às instruções do anjo. Depois de terem passado a primeira e a segunda sentinela da prisão, chegaram ao portão de ferro, que abriu-se como se fosse automatizado. Só depois de entrar numa rua da cidade e de o anjo ter apartado-se dele, Pedro deu-se conta de não estar num sonho. O Senhor livrou-o da mão de Herodes e dos judeus (12.7-11). 

 

Vemos aqui uma importante lição para nós. O visitante celestial tirou Pedro da prisão (12.17), mas o que Pedro podia fazer, o anjo não fez por ele. Pedro devia levantar-se, cingir-se, colocar suas sandálias, sua túnica e sair (12.8). Assim que Pedro estava livre, o anjo deixou-o. Agora, Pedro poderia tomar suas próprias decisões!

 

Deus comissionou uma classe de anjos para proteger o seu povo na terra (Sl 91.11; Hb 1.14). Contudo, é fanatismo esperar que Deus faça por nós o que nos mesmos devemos fazer (12.10-11). Deus não enviará seus anjos para fazer o trabalho da igreja (1 Pe 1.12). 

 

A igreja que ora recebe de Deus infinitamente mais do que poderia imaginar (Ef. 3.20). Conforme a história prossegue, Pedro foi à casa de Maria, a mãe de João Marcos (12.12-17). Quando ele chegou à casa, ele bateu na porta e esperou que alguém a abrisse (12.14). Uma criada, chamada Rode foi ver quem era, mas ficou tão alegre ao ouvir a voz de Pedro que esqueceu-se de abrir a porta! Correu para dentro a fim de dar as boas notícias aos que estavam a orar. Ao ouvirem as palavras da criada, alguns pensaram que ela havia enlouquecido, mas ela persistia em afirmar que o apóstolo estava junto do portão (12.15). Pensaram, então, tratar-se do anjo de Pedro, mas Rode afirmou que era o apóstolo em pessoa. “Então, eles abriram, viram-no e ficaram atónitos” (12.16). Eles não podiam crer que Deus concedera-lhes exatamente o que haviam pedido.

 

Vemos aqui que “não somos a primeira geração a ser tão fraca em reconhecer as respostas de Deus às nossas orações. É sempre correto orar, mesmo que sua fé seja tão fraca que você se surpreenda quando a resposta chegar!” (RC Sproul). Uma vez que nada é impossível para Deus, nada é impossível para a igreja quando ela se reúne para orar. “A oração de apenas um justo pode muito em seus efeitos” (Tg 5.16, veja tb. Mt 7.8).

 

Pedro foi libertado pelo anjo de Deus, mas em resposta às orações da igreja (12.12, 17). Como escreveu o pregador puritano Thomas Watson: “O anjo chamou Pedro na prisão, mas foi a oração que foi buscar o anjo”. A oração fervorosa da igreja reunida afectou o resultado dos acontecimentos (12.5, 12). “Suas orações imperfeitas, porém fervorosas, foram mais poderosas que Herodes e o inferno” (G. C. Morgan).

 

A igreja que ora triunfa sobre as forças do mal (12.18-23, Mt 16.18). Lucas informa que “ao amanhecer, houve grande alvoroço entre os soldados a respeito do que tinha acontecido a Pedro […] Não conseguindo encontrá-lo, Herodes interrogou os guardas e mandou executá-los.” (12.18-19a). De acordo com o código Justiniano, se um prisioneiro fugisse, sua sentença – espancamento, crucificação ou decapitação – era aplicada aos guardas responsáveis pelo turno em que o prisioneiro havia escapado. 

 

Depois disso, “Herodes partiu da Judeia e foi passar algum tempo em Cesareia” (12.19d-20). Não sabemos o motivo, mas Herodes estava muito irritado com o povo de Tiro e Sidom. Os habitantes dessas cidades aproveitaram as férias do rei em Cesareia para reconciliar-se com ele, pois dependiam dos cereais que importavam da Judeia. Fizeram amizade com Blasto, camarista do rei e, por meio dele, pediram a restauração das relações diplomáticas.

 

Lucas diz que num dia designado, Herodes fez uma aparição vestido com trajes especiais, sentou-se em seu trono e fez um discurso. Então o povo bradou: “Voz de um deus, e não de um homem!” (12.21-22). Porém, em meio à aclamação da multidão, ele subitamente contorceu-se de dor. Flávio Josefo, historiador judeu, informa que Herodes teve de ser carregado para fora do anfiteatro, e permaneceu com intensa dor por cinco dias antes de morrer, a qual, de acordo com Lucas, foi-lhe infligida por um anjo do Senhor porque Agripa estava tomando para si a glória que pertencia a Deus (12.23).

 

Ninguém jamais lutou contra o Altíssimo e prevaleceu. O anjo de Deus enviado para libertar Pedro é enviado para matar Herodes (12.7,23). Os anjos de Deus são agentes tanto da bondade como do juízo de Deus.

 

A Bíblia ensina que quando uma pessoa se exalta, ou permite que outros a exaltem, Deus a derrubará (Gn 11.4; Is 14:12–15; Dn 4.19–27). Por outro lado, os humildes e os humilhados serão exaltados! Este é o glorioso paradoxo do evangelho (Lucas 14.11, 18.14).

 

Os destinos da vida não estão nas mãos dos homens, mas nas mãos de Deus. Num momento, Tiago foi da prisão para o céu. Herodes também num momento passou de sua glória terrena para uma prisão eterna no inferno. “Bem-aventurados os mortos que morrem no Senhor” (Ap 14.13).

 

Em vez de Pedro ser morto por Herodes, Herodes é que foi morto pelo Deus de Pedro! O corpo na sepultura é comido por vermes, mas o corpo de Herodes tornou-se podre enquanto ele ainda estava vivo, criando vermes que imediatamente passaram a se alimentar dele (12.23).

 

Finalmente, na igreja que ora, a palavra de Deus cresce e multiplica-se (12.24). O rei morreu e foi comido pelos vermes, mas a Palavra de Deus não morreu (12,24). Apesar de toda oposição o trabalho da igreja progredia (At 6.7; 9.31; 12.24).

 

O crescimento numérico da igreja primitiva retrata sua vida de oração. A igreja orava e os resultados apareciam. Deus abria os corações. A pregação era poderosa (1Co 3.7). “A igreja contemporânea deveria orar mais, com mais fervor, e com mais intensidade, como o fez a igreja primitiva” … O poder para realizar a obra de Deus não vem da nossa inteligência, ou dos nossos recursos financeiros, nem mesmo das nossas habilidades pessoais, mas de Deus.” (H. D. Lopes).

 

Precisamos orar pela igreja perseguida. A situação de Pedro na prisão a espera do martírio retrata a realidade da igreja perseguida. A oração é um instrumento que Deus usa para livre os crentes perseguidos. Precisamos orar pelos nossos pastores e líderes. Se você deseja que Deus use o seu pastor ore por ele.

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Referências: Beeke, J. R.; Barrett, M. P. V. and Gerald M. Bilkes, eds. The Reformation Heritage KJV Study Bible. Grand Rapids, MI: Reformation Heritage Books, 2014), 1577–1579. / Carson, D. A., ed. NIV Biblical Theology Study Bible. Grand Rapids, MI: Zondervan, 2018, p. 1977–1978. / Crossway Bibles. The ESV Study Bible. Wheaton, IL: Crossway Bibles, 2008, p. 2106-2108. / Kistemaker, S. Atos, vol. 1: Comentário do Novo Testamento. SP: Editora Cultura Cristã, 2016, p. 559–560. / Lopes, H. D. Atos: A Ação do Espírito Santo na Vida da Igreja: Comentários Expositivos Hagnos. SP: Hagnos, 2012, p. 233–250. / MacDonald, W. Comentário Bíblico Popular: Novo Testamento. São Paulo: Mundo Cristão, 2011, p. 366–368. / Sproul, R. C. Estudos Bíblicos Expositivos em Atos. SP: Cultura Cristã, 2017, p. 182–192. 

 

Pastor Leonardo Cosme de Moraes