Um Povo Com Identidade


Um dos aspetos que diferencia a fé    bíblica das demais realidades religiosas é, sem dúvida, o seu embasamento histórico. Todo o enquadramento histórico do relato bíblico, com o envolvimento de sucessivas civilizações, de reis e reinos, de povos e nações, ao longo de séculos, confirma o seu carácter singular, em que o sobrenatural invade e penetra o tempo e o espaço, dirigindo os acontecimentos que, sem interrupção, se vão sucedendo.

Esta abordagem histórica, que envolve tensões, relacionamentos e dramas humanos, faz com que  a fé bíblica seja uma experiência essencialmente prática, e não um mero exercício contemplativo (ou místico)  que se esgota em meditações de busca de equilíbrio interior.

Uma verdadeira experiência bíblica de fé evidencia-se nas opções feitas e em decisões tomadas nas interações do dia a dia, onde o amor a Deus e ao próximo deve constituir o parâmetro pelo qual tudo  é analisado.

A salvação, portanto, deve ser encarada como uma operação de origem (e de carácter) sobrenatural, realizada pelo próprio Deus no âmago do ser humano, mas que implica uma experiência dinâmica e real de vida, que envolve todas as dimensões da personalidade, incluindo uma nova  e renovada perspetiva a partir da qual se avaliam todos os relacionamentos interpessoais.

É neste sentido que entendemos os constantes apelos feitos pelos escritores bíblicos às igrejas às quais dirigiram os seus escritos, desafiando os seus destinatários a demonstrarem, em termos práticos, e por meio de atitudes, comportamentos, ações e escolhas, a realidade e a eficácia da mudança (radical) ocorrida no interior do seu ser.

Por outras palavras, o desafio bíblico (aqui expresso por Paulo) encontra a sua versão mais acurada nas palavras de Tiago, que considera a falta de (boas) obras na vida de alguém como uma clara evidência de uma fé vaga, inconsequente e morta, que se circunscreve a um assentimento mental teórico e infrutífero, que não passa de uma simples confissão de fé (Tiago 2:14,17-20,26, cf. Tito 2:14; 3:8).

O desafio de Paulo, no nosso texto em análise, vai no sentido de que os crentes que constituíam a igreja em Éfeso deveriam andar (agir, proceder, comportar-se) de acordo com os valores da nova fé que tinham abraçado.

Ao dizer “...que andeis de modo digno da vocação a que fostes chamados”, Paulo, numa abordagem de grande sensibilidade pastoral, quis estimular os efésios ( e a todos os que são eficazmente chamados pelo Espírito Santo) a desenvolver um estilo de vida coerente com a sua fé, e a evitar qualquer espécie de “esquizofrenia existencial” reveladora de uma religiosidade defeituosa, que só confunde e é prejudicial.

No seio da igreja, onde impera uma  variedade de personalidades, de pontos de vista e de preferências, a coerência de vida deve ser nutrida pelas virtudes tais como: humildade (simplicidade assumida), mansidão (modéstia que se autorregula) e longanimidade (uma elasticidade de alma).

O exercício destas virtudes provocará, no seio da igreja, uma capacidade de apoio mútuo que, sob o alicerce do amor, fará com que a paz reine entre os irmãos, e a unidade seja mais e mais mantida e consolidada.

Que o Senhor permita que esta experiência seja uma realidade na vida de cada uma de nós. Soli Deo Gloria!   

Pr. Samuel Quimputo
set 2017