A língua desenfreada pode causar danos irreparáveis. A Escritura diz que a “morte e a vida estão no poder da língua” (Pv 18.21). As palavras têm o poder de encorajar e abater as pessoas. Elas despertam alegria ou geram angústias. As palavras podem edificar ou derrubar. Elas constroem e destroem. As palavras podem tanto aproximar as pessoas, como afastá-las umas das outras. O sábio Salomão disse que “a resposta branda desvia o furor, mas a palavra dura suscita a ira.” (Pv 15.1). É melhor ficar calado do que ofender alguém, pois as palavras uma vez proferidas, jamais podem ser recolhidas.
Por causa desta tendência de pecar com a língua, a palavra de Deus exorta a todo o ser humano a ser “pronto para ouvir e tardio para falar” (Tg 1.19). O Senhor Jesus disse: “que contamina o homem não é o que entra na boca, mas o que sai da boca, isso é o que contamina o homem" (Mt 15.11).
Ademais, a Escritura diz que “se alguém entre vós cuida ser religioso, e não refreia a sua língua, antes engana o seu coração, a religião desse é vã” (Tg 1.26). O uso da língua, portanto, é uma das formas em que o compromisso de uma pessoa com Cristo é testado.
Por meio de um argumento longo e detalhado, Tiago sublinha que a língua é uma ferramenta extremamente poderosa, sobretudo, para o mal (Tg 3.1-12). É por isso que os mestres podem pecar com muita facilidade, levando outros ao erro ao mesmo tempo. A autodisciplina da fala, conteúdo, é um dever moral de todo o ser humano (Tg 3.2-12). Jesus disse que mesmo as nossas palavras mais despretensiosas serão julgadas (Mt 12.36).
A língua é a ferramenta principal de um mestre cristão (Tg 3.1-2). No mundo cristão, o ensino não é tanto um privilégio, mas uma responsabilidade pela qual devemos prestar contas. Avaliação e crítica são ocorrências diárias na visa de um pastor-mestre ou de um professor cristão. Num sentido eclesial, a língua de um mestre guia e controla todo o corpo da igreja. Tiago destaca a responsabilidade dos professores pela saúde de suas congregações.
O Senhor Jesus ensinou que as pessoas são responsáveis pelo que dizem (Mt 12.36-37) e sabem (Lc 12.47-48). O mestre afirma saber e ser exemplo para a igreja. Na época do NT o mestre ensinava por sua vida e exemplo mais do que pela palavra. Muitos querem ser líderes e mestres na comunidade cristã. Mesmo que o desejo de se tornar mestre seja motivado pela melhor razão possível, o mestre há de receber maior juízo ("seremos julgados com maior rigor", NVI). Tiago inclui-se entre os mestres aqui.
No versículo 2 Tiago amplia o escopo sobre os mestres para considerar todos. Tiago diz que todas as pessoas tropeçam (e pecam), e o lugar mais fácil de tropeçar é no uso da língua. Portanto, se uma pessoa realmente tem a sua língua completamente sob controlo, de forma que não peque nesta área, ela de facto é tão autocontrolada como se fosse perfeita, visto que a língua é a última parte do corpo que se consegue controlar.
A língua tem um poder totalmente desproporcional ao seu tamanho em relação a outras partes do corpo humano (Tg 3.3-5). Tiago apresenta uma série de exemplos que ilustram a importância da disciplina da fala. Um cavalo, que era o principal meio de transporte terrestre da época de Tiago, é controlado por um freio na boca. Com o freio guiamos o animal e atingimos o propósito ou o curso desejado. Um navio, o maior veículo de transporte daqueles dias, era controlado por um leme. Com o leme das naus o piloto guiava o navio de maneira segura. Tiago, entretanto, muda a direção da sua argumentação e compara a língua a uma fagulha que pode pôr fogo numa floresta inteira. A fagulha ilustra os resultados trágicos e devastadores do falar incontrolado.
Há três razões pelas quais o dano que a língua pode causar é como o de um fogo: (1) O fogo alastra-se. “Vede quão grande bosque um pequeno fogo incendeia” (Tg 3.5). (2) É de vasto alcance. O perigoso da língua é que pode causar danos a grande distância. (3) É difícil de dominar. Nos ressecados bosques e matagais da Palestina, um incêndio ficava imediatamente fora de controlo. Assim também, ninguém é capaz de controlar o mal que a língua pode causar.
A língua, assim como o fogo, pode transformar a vida de uma pessoa num verdadeiro inferno de aflições. Tiago explica que é o próprio inferno (do grego γέεννα / geenna) que ateia fogo à língua. Tiago não está a falar da língua como ferramenta da linguagem dada por Deus - o dom da comunicação oral. Ele está a pensar na língua como algo corrompido pela Queda. Muitos pecados, se não todos, começam com uma palavra. Às vezes é pronunciada, outras é silenciosamente "falada" no íntimo, na mente. Nossas línguas revelam o que está em nossos corações (Mt 15.18), então elas manifestam todo o mundanismo que caracteriza os humanos - “o curso (a roda) da nossa existência”.
A língua é indomável (3.7-8). Domar significa dominar, fazer útil e benéfico; mas como diz Tiago, é o que ninguém, por si só, pôde fazer jamais com sua língua. Apesar da habilidade dos seres humanos para domar os animais, não há ser humano que consiga controlar a sua própria língua. A língua é inquieta e desassossegada. A língua sempre quer dizer alguma coisa; com frequência é veneno que produz morte. “Mesmo os santos mais perfeitos passam por momentos em que gostavam de poder engolir o que acabaram de dizer” (Douglas Moo).
Os seres humanos, por seus próprios recursos, não podem domar a língua; é uma tarefa tão difícil que requer ajuda divina. Tiago, porém, ensina que a sabedoria que vem do céu” (Tg 3.17) capacita os crentes a domar a língua e evitar brigas (Tg 3.13-4.3) e desunião dentro da igreja (Tg 4.1-3). A sabedoria de Deus manifesta-se em virtudes que promovem a paz ao invés da divisão (Tg 3.18). A lista de virtudes que caracteriza a verdadeira sabedoria é semelhante (Tg 3.17–18) à lista do “fruto do Espírito” em Gl 5.22. Em última análise, o Espírito produz essas virtudes: amor, gozo, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fé, mansidão, temperança.” (Gl 5.22).
Outrora os cristãos eram escravos do pecado e do mundo, eram filhos da ira, mas agora, salvos pela graça de Deus em Cristo, são livres para viver e andar no Espírito (Ef 2, 4; Rm 6; 8; Gl 5.24,25). Portanto, guiados pela sabedoria do céu, andando no Espírito (Gl 5.16), e levando cativo todo entendimento à obediência de Cristo (2Co 10.5), os cristãos são agora capazes de domar a língua. Aliás, como o próprio contexto de Tiago 3 indica, o domínio da língua é uma das formas em que o compromisso de uma pessoa com Cristo é testado.
A língua de um cristão deve ser coerente com a fé que ele diz professar (Tg 3.9-12). Tiago está a escrever a crentes. Na igreja, os crentes usam a língua para louvar a Deus. Imagine que em seguida estes mesmos crentes põem-se a falar mal ou a proferir palavras malditas contra alguém. Contra pessoas que foram feitas à imagem de Deus (Gn 1.26,27; 9.6). Esta dualidade, duas palavras diferentes e contraditórias saindo da mesma boca, é um tipo de hipocrisia (v. 9).
Na época de Tiago, o rei ou imperador erigia a sua estátua nas cidades do seu domínio. Se alguém insultasse ou amaldiçoasse a estátua, era tratado como se tivesse amaldiçoado o imperador em pessoa, cara a cara, pois a estátua era a imagem do imperador. Por isso, o insulto a uma pessoa, feita à imagem de Deus, é como um insulto ao próprio Deus.
A mesma língua não deve ser capaz de abençoar e amaldiçoar (v.10). É tão incongruente para um cristão, cujo coração o Espírito de Deus transformou, pronunciar palavras falsas e malignas quanto para uma figueira dar azeitonas; uma videira, figos; ou uma fonte salgada, água doce. Por está causa admoestou Paulo: “Mas agora, despojai-vos também de tudo: da ira, da cólera, da malícia, da maledicência, das palavras torpes da vossa boca.” (Cl 3.8).
Infelizmente há pessoas que vivem amaldiçoando. A Escritura, porém, adverte: “Se amarmos a maldição ela nos sobrevirá, se não desejarmos a bênção ela se afasta de nós” (Sl 109.17). Mas aos seus servos o Senhor, a Escritura diz: “Nenhum mal te sucederá, nem praga alguma chegará à tua tenda.” (Salmos 91.10). O povo de Deus não deve ser supersticioso, pois nenhuma alcança aqueles que estão em Cristo (Nm 22.6; 23.8,20,23). Além do mais, é Deus quem administra estas coisas: tanto a bênção quanto a maldição (Dt 28).
Que nossas palavras sejam sempre palavras de bênção para aqueles que nos ouvem! Abençoar é invocar a bênção divina em favor de uma pessoa (Lucas 10.5). Abençoar é um ato de fé - “Pela fé, Isaque abençoou Jacó e Esaú, no tocante às coisas futuras. Pela fé, Jacó, próximo da morte, abençoou cada um dos filhos de José e adorou encostado à ponta do seu bordão” (Hb 11.20-21).
Pelas palavras se conhece uma pessoa (Tg 3.11,12; Mt 7.16-20). As palavras expressam os pensamentos do homem e as intenções do seu coração. A árvore boa é conhecida pelos bons frutos, a qualidade de uma fonte é provada pela água que flui do seu interior. A implicação deste argumento é que se estamos proferindo insultos ou maldições, esta é a nossa natureza. O nosso louvor é um disfarce, um tipo de hipocrisia.
Portanto, uma pessoa torna-se conhecida por suas próprias palavras e actos. Você acredita naquilo que faz, e não no que diz. Há pessoas que dizem: Eu amo Jesus, mais não guarda os seus mandamentos (Jo 14.15; 15.10). Outros dizem: Deus esta em primeiro lugar em minha vida, mas sempre deixa as coisas de Deus para mais tarde, e ocupa-se com os cuidados desta vida (Mt 6.33). A contradição moral é dizer uma coisa e fazer outra. É quando nossos actos desmentem as nossas palavras.
Advertências bíblicas solenes:
1. A Escritura adverte-nos contra uma séria de pecados que são cometidos com a língua: A calúnia e a difamação (Sl 101.5; Lv 19.16; Tg 4.11); o boato e a mentira (Pv 26.20; Ap 21.27; 22.15); a murmuração = falar em voz baixa, reclamando ou desacreditando (Fp 2.14 Êx 16.8); as palavras torpes (Ef 4.29; Cl 3.8); semear contenda entre os irmãos (Pv 6.16, 19), uma prática que Deus abomina.
2. A Escritura adverte-nos que mesmo as nossas palavras mais despretensiosas serão julgadas por Deus. Quando falamos, em qualquer ocasião, Deus presta atenção (Malaquias 3.16). Ele ouve e avalia a qualidade da palavra, sua origem e motivações. O Senhor Jesus disse “que de toda a palavra ociosa que os homens disserem hão de dar conta no dia do juízo. Porque por tuas palavras serás justificado, e por tuas palavras serás condenado” (Mt 12.36-37).
3. A Escritura adverte-nos que o mau uso da língua atrai infelicidade e sofrimento. Como escreveu o apóstolo Pedro: “… quem quer amar a vida e ver os dias bons, refreie a sua língua do mal, e os seus lábios não falem engano” (1 Pedro 3.10).
4. A Escritura adverte-nos que guiados pela sabedoria de Deus, andando no Espírito (Gl 5.16), e levando cativo todo entendimento à obediência de Cristo (2Co 10.5), os cristãos são agora capazes de domar a língua. Portanto, controlar a própria língua é uma tarefa tão difícil que requer ajuda divina (Fl 2.13). Precisamos fazer a mesma oração de Davi no Sl 141.3: “Põe, ó SENHOR, uma guarda à minha boca; guarda a porta dos meus lábios”.
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Pastor Leonardo Cosme de Moraes