O Progresso do Evangelho

 Atos 5:12-42

Cada vez que o evangelho encontra oposição em Atos, Deus encontra uma maneira de fazer avançar a mensagem. Ninguém pode destruir o evangelho, porque é o poder de Deus para a salvação, tanto em Jerusalém como até os confins da terra (Rm 1.16). A mensagem do evangelho é poderosa, salvadora e eficaz quando abençoada pelo Espírito Santo. Deus usa a pregação para trazer a alma espiritualmente morta à vida e para aumentar a vida de Cristo na alma crente.

 

O crescimento explosivo da igreja (5.12-16). Depois da morte de Ananias e Safira, os apóstolos continuaram a realizar milagres no meio do povo que se reunia no Pórtico de Salomão. A presença e o poder de Deus podiam ser claramente percebidos, de modo que ninguém ousava ajuntar-se a eles levianamente nem fazer profissões de fé superficiais. Todos reconhecem que Deus impõe altos padrões à comunidade sagrada em que Ele habita (5.13). E, no entanto, muitos vieram a crer no Senhor Jesus e se juntaram à igreja, tanto homens como mulheres (5.14).

 

Este aparente paradoxo mostra que o crescimento da igreja não é superficial, mas vem daqueles que calculam o custo e estão verdadeiramente comprometidos. A poda de um crescimento ruim (como Ananias e Safira) produz um crescimento novo e bom (Jo 15.1-11). Apesar do medo demonstrado pelos incrédulos, o Espírito Santo está agindo no coração de homens e mulheres.

 

Os apóstolos cumpriram o primeiro estágio da comissão de Jesus (5.28; 1.8). Eles encheram Jerusalém da doutrina de Cristo. Muitos dos que creram levavam os enfermos e os colocavam sobre leitos e macas para que a sombra de Pedro se projetasse nalguns deles enquanto ele passava. Das cidades vizinhas, afluíam os doentes e endemoninhados (pessoas atormentadas por espíritos imundos), e todos eram curados (5.12-16).

 

A sombra de Pedro não possuía poderes mágicos, mas, como quando o poder de cura de Jesus fluiu de Sua vestimenta ao toque da mulher que estava com fluxo de sangue (Mc 5.28; Lc 8.44), aqui Deus permite que a sombra de Pedro efetue as curas (At 5.15), como também fez por meio das roupas e lenços que Paulo havia usado (19.11, 12).

 

Como Hebreus 2.4 deixa claro, esses milagres constituíram o selo de Deus sobre o ministério dos apóstolos. Os sinais e prodígios eram credenciais do apostolado (2Co 12.12). Em todo o caso, o Deus que criou o universo interfere nele quando quer, onde quer, conforme sua soberana vontade.

 

Os apóstolos cumpriram o primeiro estágio da comissão de Jesus (5.28; 1.8). Eles encheram Jerusalém da doutrina de Cristo. Pessoas das vilas e aldeias vizinhas de Jerusalém começaram a afluir para a cidade e  juntaram-se à igreja (5.16). Isto, porém, provocou a fúria das autoridades da época.

 

A perseguição à igreja (5.17–32). O ministério de cura dos apóstolos provocou uma segunda onde de perseguições por parte das autoridades judaicas (5.17, 18). Sua motivação é a "inveja" (5.17, 18; cf. 13.45; 17.5), por causa da crescente influência dos apóstolos entre o povo.

 

Desta vez, a reação dos saduceus é mais severa. Mandam prender todos os apóstolos (5.17-20). Mas de noite, um anjo do Senhor abriu as portas do cárcere e, conduzindo-os para fora, lhes disse: Ide e, apresentando-vos no templo, dizei ao povo todas as palavras desta Vida (5.19,20). 

 

Os apóstolos não foram libertados da prisão simplesmente para escapar. Incumbidos de um novo serviço no templo, eles deveriam anunciar publicamente ao povo as palavras desta Vida (o evangelho não é simplesmente uma questão de devoção privada). Todas as palavras desta vida exprimem a mensagem da salvação  e da vida eterna por meio de Jesus Cristo (5.20). Somente Jesus tem as palavras da vida eterna (João 6.68), e a vida eterna consiste em conhecer a Deus por meio Dele (João 17.3).

 

Toda a cena tem um ar de comédia (5.21-25). Os anciãos se reúnem e chamam os prisioneiros apenas para descobrir que a prisão está trancada, mas os prisioneiros haviam desaparecido! Então, um mensageiro anuncia que os apóstolos estão mais uma vez a pregar nos pátios do templo! É igualmente irónico que um anjo de Deus frustre e confunda um tribunal dominado por saduceus que negam a existência de anjos (5.24; 23.8).

 

Lucas informa que o capitão do templo e os seus guardas prenderam novamente os apóstolos (5.26), apresentando-os ao Sinédrio pela segunda vez, para que fossem interrogados (5.27). O sumo sacerdote estava furioso com os apóstolos por dois motivos (5.27,28): porque uma ordem expressa do Sinédrio fora desobedecida por eles; e porque os apóstolos acusavam as autoridades judaicas de serem responsáveis pela crucificação do Messias.

 

Em resposta à primeira acusação do sumo sacerdote, Pedro elabora uma memorável cria verbal: ”Mais importa obedecer a Deus do que aos homens.” (At 5.29). Uma cria é um breve ditado ou ação que elucida um ponto; é geralmente tão curta quanto uma única frase — mas, ao contrário de uma máxima, era atribuída a um personagem (Theon, em Kennedy 2003, 15). 

 

Os versículos 30 ao 32, fornecem a justificativa do argumento. O versículo 30 primeiro oferece a causa: “O Deus de nossos pais ressuscitou Jesus”. Se Jesus ressuscitou, ele deve ser obedecido. A segunda metade do versículo dá a justificativa para não obedecer à autoridade humana, neste caso o Sinédrio: “ao qual vós matastes, suspendendo-o no madeiro”. Os versículos 31 e 32 oferecem argumentos de exemplo para a verdade da cria: Deus exaltou Jesus como Príncipe e Salvador; e os apóstolos e o Espírito Santo são testemunhas dessas coisas. Portanto, a cria elaborada por Pedro serve para destacar a afirmação radical dos apóstolos de que eles devem seguir os mandamentos de Deus em vez da autoridade que os ameaça. 

 

Por outro lado, Pedro declara que tanto o arrependimento quanto a remissão de pecados são dádivas de Deus a Israel (5.31; Lc 24.47; At 2.38; e dos gentios também 13.38). Todo o que depositar sua confiança em Jesus, arrepender-se e for batizado recebe o perdão e o Espírito Santo (2.38,39; 13.38, inclusive os gentios). Deste modo, Pedro convoca o sumo sacerdote e seus associados à obediência, à fé e ao arrependimento. As autoridades (5.33), porém, ouvindo as declarações de Pedro, se enfureceram e deliberaram matar os apóstolos.

 

O conselho de Gamaliel (5.34-40). Então Gamaliel jogou água na fervura e chamou os saduceus à reflexão (5.34,35). Gamaliel era filho do rabino Simeão e neto do influente rabino Hilel, que fundara uma escola para os fariseus (Mt 19.3). Gamaliel tornou-se líder nessa escola, que era conhecida por sua tendência mais liberal do que a sua rival, a escola do rabino Shamai. Gamaliel foi o rabino mais proeminente de sua época e o professor de Paulo (At 22.3). Na literatura judaica, Gamaliel é mencionado repetidas vezes como Rabi Gamaliel, o Ancião, que emitiu conselhos concernentes a assuntos relacionados ao relaxamento da observância do sábado e proteção para as mulheres em caso de divórcio. Seu período de influência foi aproximadamente de 25 d.C. a 40 d.C. Lucas retrata Gamaliel como um destacado líder no julgamento dos apóstolos.

 

Depois de mandar retirar os apóstolos da assembleia, Gamaliel oferece um breve discurso deliberativo para tentar acalmar os ânimos do Sinédrio (5.34-35). Para fundamentar seu argumento, ele cita os exemplos históricos de Teudas e Judas, o Galileu, líderes de movimentos revolucionários que foram significativos por um tempo, mas não deram em nada (5.36-37). “Teudas”, provavelmente, foi um dos muitos líderes dos movimentos revolucionários após a morte de Herodes, o Grande em 4 a.C. Ele foi um líder auto-proclamado de cerca de quatrocentos rebeldes que foi morto e cujos seguidores se dispersaram. Judas, o Galileu, liderou uma revolta fiscal contra os romanos por volta de 6 d.C, quando Arquelau foi deposto e novos impostos entraram em vigor (Josefo, Antiguidades Judaicas 18,23). Suas ações inspiraram o movimento zelote posterior que provocou a guerra judaica de 66-73 d.C. Por fim, este movimento também […] pereceu e seus seguidores foram dispersos (5.33-37).

 

Empregando duas sentenças condicionais, Gamaliel convence seus ouvintes de que se o novo movimento for de origem humana, fracassará, mas se sua origem for divina, o Sinédrio é que fracassará, pois estará lutando contra Deus (2Cr 13.12; Pv 21.30). Do ponto de vista do narrador, o Sinédrio está lutando contra Deus (5.39). Além disso, o crescimento da igreja confirma a afirmação de Gamaliel à medida que o evangelho avança (5.39).

 

Gamaliel estava metade certo e metade errado quando disse, “Se esse conselho, ou essa obra vem de homens, perecerá”. Na História há evidências abundantes de falsas religiões que não desapareceram da face da terra. A heresia gnóstica que afligiu a igreja no 2° e 3° séculos está bem viva atualmente (o Código Da Vinci, de Dan Brown, é um exemplo). Gamaliel tinha a ideia equivocada de que, se algo não era de Deus, não daria certo. Mas essa ideia não levava em consideração a natureza pecaminosa humana e a presença de Satanás no mundo. O sucesso não é prova de que algo é verdadeiro. Seitas falsas muitas vezes crescem mais rapidamente que a igreja de Deus.

 

A parte correta e verdadeira do conselho de Gamaliel era: “Se é de Deus, não podereis destruí-la”. A igreja de Jesus Cristo, embora golpeada e assaltada por todos os lados não falhará. Ela é a única instituição da face da terra que tem uma garantia absoluta e incondicional do seu sucesso futuro. Nem toda igreja local ou membro de igreja, mas a verdadeira igreja de Cristo será sempre vitoriosa, e não poderá ser barrada por questões humanas. 

 

Gamaliel incentivou a neutralidade, mas Jesus deixou claro que é impossível permanecer neutro em relação à sua pessoa e à sua mensagem: Quem não é por mim, é contra mim; e quem comigo não ajunta, espalha (Mt 12.30). Os indecisos decidem-se contra Cristo, e não a seu favor.

 

O testemunho dos apóstolos (5.40-41). Os oficiais seguiram o conselho de Gamaliel e deixaram os apóstolos ir, mas não antes de ordenar-lhes que não falassem mais no nome de Jesus e então os açoitaram impiedosamente (5.40-41). Os açoites eram aplicados com um chicote feito de couro, na parte superior do corpo nu do ofensor (Mt 10.17). A Mishná judaica diz para administrar um terço de tais golpes no peito e dois terços nas costas. Segundo a lei mosaica o número de açoites contra um condenado não pode exceder a 40 (Dt 25.2,3). Paulo escreve que foi açoitado 5 vezes e que recebeu dos judeus os estipulados 40 açoites menos um (2Co 11.24).

 

A reação dos apóstolos parece contrária às emoções humanas comuns. Os apóstolos se retiraram do Sinédrio com as costas brutalmente laceradas e a sangrar, mas, ainda assim, regozijando-se por terem sido considerados dignos de sofrer afrontas por esse Nome (5.41). Os apóstolos consideram um privilégio sofrer por Cristo, porque Jesus sofreu muito por eles (veja Mt 5.11–12; Rm 5.3; Cl 1.24; Tg 1.2-3; 1 Pe 4.13). Em nenhum lugar a Bíblia nos diz para escolher o sofrimento pelo sofrimento. Entretanto, se seguir a Cristo traz sofrimento, não devemos recuar, mas aprender com os apóstolos a ver nosso sofrimento como um privilégio à luz do propósito de Deus. Tal resposta é consistente com o ensino de Jesus: “Bem-aventurados sereis quando os homens vos odiarem e quando vos separarem, e vos injuriarem, e rejeitarem o vosso nome como mau, por causa do Filho do homem. Folgai nesse dia, exultai; porque eis que é grande o vosso galardão no céu …” (Lc 6.22,23). Anos mais tarde, o próprio Pedro encoraja os cristãos oprimidos da Ásia Menor: “Regozijai-vos na medida que sois co-participantes dos sofrimentos de Cristo” (1Pe 4.13; 2Ts 1.4; 2Co 4.17).

 

Os apóstolos passaram novamente por cima das proibições do tribunal, pois todos os dias, em público e em particular, no templo e de casa em casa, não cessavam de ensinar, e de pregar Jesus, o Cristo (5.42). Proibir os discípulos de falar em o nome de Jesus era o mesmo que proibir o sol de brilhar!

 

A perseguição refina a igreja, mas não a destrói (At 6.1). Tertuliano, falando às autoridades do Império Romano, exclamou: "Matem-nos, torturem-nos, condenem-nos, façam de nós pó ... Quanto mais vocês nos oprimirem, tanto mais cresceremos; a semente é o sangue dos cristãos”.

 

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Pastor Leonardo Cosme de Moraes