Esta passagem apresenta o primeiro confronto da igreja com a liderança judaica e suas consequências. O primeiro milagre foi seguido pela primeira perseguição contra a igreja. A secção divide-se em três partes: a prisão (vv. 1–4), a audiência (vv. 5–12) e as ameaças (vv. 13–22).
Do templo para a prisão (4.1,2). Pedro pregou o seu segundo sermão e a igreja cresceu - “muitos ... dos que ouviram a palavra a aceitaram, subindo o número de homens a quase cinco mil” (4.4). A reação do Sinédrio foi imediata. Vários sacerdotes que estavam no serviço do templo (Lucas 1.8, 23), perto do Pórtico de Salomão, puderam ouvir as declarações de Pedro sobre Jesus.
Os sacerdotes eram membro do partido dos saduceus (4.1). Ao contrário das outras seitas judaicas do primeiro século, como os fariseus, os saduceus não acreditavam na doutrina da ressurreição (At 23. 6-8; Lc 20.27-40). Eles criam que a era messiânica havia começado no período dos macabeus; portanto, não estavam à espera de um Messias. É por isso que os saduceus ficaram irritados com a pregação de Pedro de que em Jesus a ressurreição geral havia começado (4.2). Assim, os sacerdotes se fizeram acompanhar do capitão da guarda do templo (totalmente composta por levitas), e dos saduceus para tirar satisfação com Pedro e João. As acusações eram: perturbação da ordem e pregação de heresia.
Como já era tarde (Atos 3.1) e a alta corte judaica reunia-se pela manhã, Pedro e João foram colocados em detenção durante a noite (4.3). Por conseguinte, a prisão dos apóstolos não fechou a porta da igreja para a entrada de novos conversos. De acordo com o versículo 4, quase cinco mil homens ingressaram na comunhão dos santos. A maioria dos comentaristas acreditam que esse número inclui os três mil do Pentecostes; outros afirmam que não. De qualquer modo, não inclui mulheres e crianças.
Aplicação: Prestígio e poder não são necessários para que as pessoas sejam atraídas por Cristo. A multidão não abandonou a fé por causa da prisão dos apóstolos. A fé, que é gerada pelo evangelho de Cristo, não pode ser destruída pelas perseguições. Nenhuma oposição pode obstruir o avanço do evangelho de Jesus Cristo.
Da prisão para o tribunal (4.5-11). No dia seguinte, o conselho de autoridades, conhecido como Sinédrio, reuniu-se para fazer um inquérito e colocar um ponto-final nas atividades dos apóstolos (4.5). Este conselho incluía o sumo sacerdote e membros de sua família (v. 6); outros saduceus; fariseus (Mt 27.62); e “anciãos", que eram homens do mais alto escalão da sociedade judaica. Os homens listados no versículo 6 constituem a liderança do conselho.
O tribunal começou o interrogatório com uma pergunta direta a Pedro e João: Com que poder ou em nome de quem vocês fizeram isto” (referindo-se a cura do coxo, 4.7)? Então Pedro, cheio do Espírito Santo, dá todo o crédito a Jesus Cristo, o nazareno. Pedro exalta a Jesus (4.10-11). Ele aponta para Jesus cumprindo um dos Salmos: “a pedra que os construtores rejeitaram tornou-se a pedra angular” (Sl 118:22, Lc 20.17; 1Pd 2.4-8). O crucificado é aquEle a quem os construtores (os líderes dos judeus) rejeitaram, mas na ressurreição dos mortos, Deus o fez cabeça de esquina - o alicerce de Seu edifício espiritual (At 4.11; 1 Co 3.11; Ef 2.20; 1Pd 2.6–7).
Jesus agora ocupa a posição principal do edifício, a pedra angular (usada como o padrão para assegurar que as demais pedras estivessem alinhadas e niveladas), em torno da qual o igreja de Deus está construída. Somente no Jesus rejeitado, mas agora exaltado, a salvação pode ser encontrada. No entanto, os judeus tropeçaram na pedra (Rm 9.32, 1 Pd 2.8) e a rejeitaram, exatamente como o Salmo 118.22 havia previsto. Mas, para os que crêem em Jesus Cristo, Ele é a "pedra angular, eleita e preciosa" (1 Pe 2.4-8; Ef 2.20, 1 Co 3.11).
Aplicação: Que erro enorme dos edificadores! Rejeitaram a pedra mais importante do edifício! Este foi o erro de Israel: rejeitar Jesus como seu Messias. Apesar desta rejeição, Deus exaltou-o à sua posição certa: a de Pedra Angular ou Fundamental.
Jesus Cristo, o único caminho (4.11-12). É frequentemente afirmado hoje que as pessoas podem ser salvas sem saber nada sobre Jesus. O versículo 12 está em absoluto contraste com essa ideia. Não há princípio mais básico para a cultura secular contemporânea do que a tolerância religiosa. Estamos de acordo que pessoas de todos os credos religiosos são bem-vindos à nossa terra e lhes deve ser concedida a liberdade religiosa de forma que todas as religiões sejam igualmente toleradas sob a lei. Hoje, no entanto, o pressuposto do secularista é que todas as religiões não devem ser somente toleradas igualmente perante a lei, mas todas são igualmente válidas ou inválidas. A ideia hoje é que não importa no que você crê, contanto que você seja sincero, pois há muitos caminhos que levam para o céu. Não há nada em nossa cultura atual mais intolerável do que a exclusividade, do que deparar-se com a afirmação cristã de que há somente um único caminho para Deus. Precisamos estar preparados para nos posicionarmos contra a onda de relativismo em nossa cultura.
O apóstolo Pedro, porém, não é era um defensor do pluralismo religioso (4.12). Pedro anuncia que a salvação não pode ser obtida de nenhum outro modo a não ser pelo nome de Jesus Cristo. A declaração de Pedro de que não havia salvação em nenhum outro nome era um convite ao Sinédrio para colocar sua fé em Jesus (4.12). A salvação é concedida exclusivamente àqueles que abraçam Jesus Cristo pela fé. “Por meio de seu nome, todo aquele que crê receberá o perdão dos pecados” (At 10.43).
Os dois negativos (nenhum outro e nenhum outro nome) proclamam a singularidade do nome de Jesus. Não há ninguém além de Jesus que tem os meios para providenciar a salvação, mesmo para os judeus que têm acesso à revelação de Deus escrita. O próprio Senhor Jesus disse: “Ninguém vem ao Pai senão por mim” (Jo 14.6). Jesus recebeu esse nome porque “ele salvará o seu povo dos pecados deles” (Mt 1.21).
A palavra devamos revela uma necessidade divina estabelecida por Deus, como parte do seu plano, para salvar-nos por intermédio da pessoa e obra de Jesus Cristo. Essa palavra significa que o homem tem uma responsabilidade moral de responder a chamada para crer em Jesus e, assim, apropriar-se da salvação. Como diz a Escritura: “Quem crê nele não é condenado; mas quem não crê já está condenado, porquanto não crê no nome do unigênito Filho de Deus” (Jo 3.18). “Quem tem o Filho tem a vida; quem não tem o Filho de Deus não tem a vida” (1 Jo 5.12).
Certa feita, perguntaram ao Dr Sproul (2000): Como você pode crer num Deus tão
intolerante, que providenciou somente um único caminho de salvação
para o mundo? Ele respondeu:
“Eu não sei porque Deus não nos deu 5 salvadores ou 15 caminhos
religiosos para satisfazê-lo. Vamos, contudo, tomar uma situação hipotética:
Suponha que exista um Deus. Suponha que esse Deus seja por completo
absolutamente santo. Suponha que esse Deus, não por mera necessidade em si
mesmo, mas por puro amor e bondade cria um mundo, e ele o habita com um vasto
tipo de animais e plantas. E, então, quando ele termina, sua coroação da
criação é uma criatura que Ele molda em Sua própria imagem. E Ele sopra nesta
criatura seu próprio fôlego, e dá a essa criatura preeminência sobre toda
criação, domínio sobre todo o mundo. E Ele dá-lhe a tarefa de espelhar e
refletir o próprio santo caráter de Deus. E Deus gratuitamente derrama nessa
criatura todos os tipos de benefícios. Mas dá a essa criatura uma única
restrição e diz: “você não tem permissão para comer este específico fruto”. E,
assim, que Deus volta suas costas, suponha que essa criatura totalmente
ingrata, que deve tudo ao seu criador, vira-se e agarra aquele fruto por querer
igualdade com seu criador e abertamente e desejosamente desafia a lei de Deus.
E Deus tinha dito que se ele fizesse aquilo ele iria morrer. Agora, suponha que
Deus tivesse eliminado a humanidade da terra. Ele teria sido perfeitamente
justo ao fazer isso, não teria?
Mas suponha que Deus era tão paciente, tão bondoso que ele diria: Eu cobrirei a nudez dessa criatura. Eu providenciarei um caminho de salvação para ela. Eu prometerei tirar esse pecador ingrato de sua condição desesperada. Eu vou enviar a esse povo, que rejeitou tudo o que eu fiz por eles, o meu único filho. Eu vou transferir os pecados do meu povo para as costas do meu Filho, que é perfeitamente justo e santo. E eles matam o Filho! E Deus diz: está tudo bem. Vocês mataram o meu Filho, mas se vocês somente colocarem sua confiança Nele e honrarem-o, eu os perdoarei de todo pecado cometido contra mim e contra Ele. E eu lhes darei vida eterna, onde não haverá mais morte, nem lágrimas, nem perversidade, nem dor ou sofrimento, e vocês viverão para sempre numa felicidade interminável. Mas minha única exigência é que vocês honrem aquele que morreu em seu lugar. Buda não morreu por você. Moisés não morreu por você. Maomé não morreu por você. Eu exijo que vocês honrem e sigam meu único Filho. Você ousaria levantar-se diante de Deus no dia do julgamento e dizer: Deus, você não fez o bastante? Você olharia para a face de Deus e diria: um único caminho para a salvação não é suficiente?”
A questão não tem nada haver com a superioridade das pessoas. As pessoas que acreditam em Cristo não são melhores do que as pessoas que acreditam em outra coisa. Mas não há dúvida de que é uma afronta para o Deus Todo-Poderoso ouvir qualquer ser humano mencionar Buda em pé de igualdade com Jesus Cristo. Porque somente Cristo é sem pecado. Buda foi um pecador. Buda não podia salvar a si mesmo. Tampouco o pode qualquer outra pessoa. Maomé foi um pecador e ele nunca salvou ninguém. Somente Cristo é sem pecado. Somente Cristo providenciou redenção para nós. Este é o único caminho que Deus providenciou. Portanto, arrependa-se dos seus pecados e coloque a sua confiança e sua fé somente em Jesus Cristo.
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Referências: Beeke, J.
R.; Barrett, M. P. V. & Bilkes, G. M. ed. 2014. The Reformation Heritage
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Sproul, R. C. 2017. Estudos Bíblicos Expositivos em Atos.
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Em voltemosaoevangelho.com/blog/2009/04/r-c-sproul-jesus-cristo-o-unico-caminho/ Data
de acesso: 07/07/2021. Stott, J. 2000. A Mensagem de Atos: até os confins da
terra. SP: Editora ABU.
Pastor Leonardo Cosme de Moraes