A ENCARNAÇÃO DE CRISTO

 

João 1.1-18


O prólogo do evangelho de João resume a forma como o Filho de Deus foi enviado ao mundo. Quando escreve que Jesus Cristo é o verbo (do grego ´Logos´ = ’palavra’), João está declarando que Jesus tanto expressa como reflete a mente de Deus (1.18). Jesus é a ‘Lógica de Deus’. Jesus Cristo é a verdade, a razão e a sabedoria de Deus encarnada (Jo 14.6; 1 Co 1.24,30; Co 2.3). Nas palavras de Paulo, Jesus é aquele em quem “todas as coisas subsistem” (Co 1.17), trazendo ordem e harmonia para o universo criado.


O Verbo já existia antes de todas as coisas (1.1). “No princípio era o Verbo” … Jesus, como Deus, não passou a existir depois que nasceu em Belém. Quando tudo começou (Gn 1.1), o Verbo já existia. Ele já existia antes que a matéria fosse criada e antes que o tempo começasse. 


O verbo é uma pessoa igual ao Pai em essência, mas distinto em personalidade (1.1b,2). “… e o Verbo estava com Deus” … “Ele estava no princípio com Deus”. Antes da criação do universo o Verbo desfrutava de plena comunhão com Deus (Jo 17.5) - o Deus filho estava “face a face com o Deus Pai”. O Verbo não é uma energia cósmica, mas uma pessoa. O Verbo é Jesus. O Verbo é distinto do Pai, mas participa da própria natureza de Deus.


O Verbo é Deus (1.1c). “…e o Verbo era Deus”. O Pai e o Filho são um único ser, mas distintos em termos de personalidade. Temos de ver um sentido em que Cristo é o mesmo que Deus, o Pai, mas, apesar disto, sermos capazes de distingui-Lo do Pai. A Bíblia revela-nos a existência de um único Deus verdadeiro (Dt 6.4; 1 Co 8.4). A Bíblia revela-nos que o único Deus verdadeiro é Pai, Filho e Espírito Santo (Mt 3.16; Mt 28.19; 2 Cor 13.14; Ef 3.1-5, 14-17; 4,4; 5,18-20; 1Co 12,4-6; 1Pe 1.2; Jo 14,26; 15,26; Jd 20). Vemos na Bíblia que o Pai testificou do Filho (Mt 3.17); e o Filho testificou do Pai (Jo 5.19). O Filho testificou do Espírito (Jo 14.26), e mais tarde o Espírito testificou do Filho” (Jo 15.26). Portanto, o Deus revelado nas Escrituras é um em essência, e três em personalidade. Por outras palavras, em Deus não há três indivíduos separados uns dos outros, mas somente auto-distinções pessoais dentro da essência divina, que é numericamente uma só. Contudo, as auto-distinções do Ser Divino implicam um “Eu”, “Tu”, e “Ele” no Ser de Deus, que assumem relações pessoais uns com os outros (Mt 3.16; 4.1; Jo 1.18; 3.16; 5.20-22; 14.26; 15.26; 16.13-15). 


O Verbo é o agente da criação (1.3). “Todas as coisas foram feitas por ele, e sem ele nada do que foi feito se fez”. O Verbo não é uma parte do mundo que começou a existir no tempo. O Verbo estava com Deus na eternidade, antes do tempo. O Verbo é o agente divino na criação do universo. Foi ele quem trouxe à existência as coisas que não existiam, tanto as terrenas como as celestiais (Cl 1.16). Hebreus 1.2 fala a respeito do Filho de Deus por meio de quem também fez o universo. Nas duas obras de criação, na primeira (Gn 1.1) e na Nova Criação (Jo 1.1), o agente é a Palavra de Deus.


O Verbo tem vida em si mesmo (1.4). “A vida estava nele e era a luz dos homens.” Nenhuma criatura tem vida em si mesma. Só Deus tem vida em si mesmo. O Verbo é a vida, a luz dos homens. Ele é a fonte da vida eterna (3.15,16; 20.31), da vida abundante (10.10). 


O Verbo é a luz que prevalece (1.5, 9). “A luz resplandece nas trevas, e as trevas não prevaleceram contra ela”. Jesus é a luz do mundo (8.12). A luz que faz desaparecer o caos (1.5). Jesus é a luz verdadeira que ilumina a toda humanidade (1.9). Ele é a luz que veio iluminar e esclarecer a humanidade. João Batista foi enviado por Deus para testemunhar de Jesus. Ele era o arauto da luz, e não a luz (1.6-9). João testemunhou a respeito dele, exclamando (1.15): “Este é aquele de quem eu dizia: Ele vem depois de mim, mas é mais importante do que eu, pois já existia antes de mim.”


O Verbo estava no mundo, e este foi feito por meio dele, mas o mundo não o reconheceu. Quando ele veio, os judeus não o receberam (1.10, 11). Agora, pessoas de todos povos, que receberem a Cristo, receberão o poder de serem feitos filhos de Deus. Este poder é conferido aos que creem no seu nome (1.12). Portanto, a fé salvadora não opera pelos meios naturais, mas de forma sobrenatural (1.13). O nascimento na família de Deus não tem nada que ver com laços raciais, nacionais ou familiares. A filiação espiritual é recebida pela fé em Jesus Cristo.


O Verbo tem plenitude de graça (1.16, 17). A lei foi dada por meio de Moisés; a graça e a verdade vieram por meio de Jesus Cristo (1.17). A lei é boa, santa, justa, porém nós somos pecadores (Rm 7). A lei é inflexivelmente exigente, e nunca conseguimos atender às suas exigências. Por isso, pela lei estamos condenados. Mas em sua vida, morte e ressurreição, Jesus Cristo cumpriu todos os requisitos da lei; agora, Deus pode partilhar a plenitude da graça com os que creem em Cristo.


O Verbo é o revelador do Pai (1.18). Ninguém jamais viu a Deus. O Deus unigénito, que está ao lado do Pai, foi quem o revelou. Jesus veio como a revelação suprema de Deus ao homem (João 1.1,14,18; Hb 1.1–3). Jesus é o único que pode trazer Deus às pessoas e levar as pessoas a Deus. Jesus revela o Pai a todo aquele que Nele crê (1.18; 14.7,9).


O Verbo tornou-se carne (1.14; cf. tb. Fp 2.5–11). A encarnação de Cristo é um mistério que surpreende os homens na terra e os anjos no céu (1Tm 3.16). Em Jesus Cristo, há a união do divino e do humano: ele é verdadeiro Deus e verdadeiro homem. Para nossa salvação, sua humanidade é tão importante quanto a divindade. Se Jesus fosse só um homem, ele estaria a uma distância infinita de Deus tanto quanto nós. Da mesma forma, se Jesus fosse apenas Deus, ele estaria a uma distância infinita de nós. Como mediador, todavia, ele preenche a lacuna entre o Deus infinito e o homem finito.


Muitas passagens da Escritura testemunham a divindade de Cristo (Mt 28.18). O apóstolo João o chama Alfa e Ômega (Ap 1.8,17; 22.13); sua pré-existência é assumida (1.1; 8.58; 17.5; 2Co 8.9); ele é aquele que sustenta todas as coisas (Jo 1.3; Cl 1.16,17; Hb 1.3) e que possui o domínio sobre todas as coisas (Mt 11.27; Ef 1.20–22; Cl 2.10); ele é designado “Deus” (Jo 1.1; 20.28; Rm 9.5; Hb 1.8,9; 2Pe 1.1). As evidências de sua humanidade são igualmente claras e convincentes. Mateus, por exemplo, regista com cuidado sua ascendência humana (Mt 1; v. tb. Rm 1.3). João nota que os cristãos confessam que Jesus veio em carne (1Jo 4.2). Todos os autores do Novo Testamento esforçam-se para provar que Jesus morreu na cruz e lemos que ele comeu (Mt 9.10), chorou (Jo 11.35) e teve sede (Jo 19.28). Mesmo assim, não vemos um conflito entre estas duas naturezas (Jones, 2018).


Na união, cada natureza preserva suas propriedades essenciais. Não há mistura ou confusão das duas naturezas. As duas naturezas são distintas, mas inseparáveis na pessoa de Cristo. A natureza divina possui infinito conhecimento, poder, domínio e assim por diante. A natureza humana obedeceu, morreu, ressuscitou e assim por diante. Assim, podemos dizer que a pessoa de Jesus, o Filho de Deus, age segundo ambas as naturezas. O que uma natureza faz, divina ou humana, é sempre atribuída a pessoa única de Cristo. Nele não há divisão, mistura ou confissão. Ele é uma só pessoa com duas naturezas unidas e inseparáveis. 


Por fim, a união das duas naturezas de Cristo é indissolúvel; ele ressuscitou como Filho de Deus em poder (Rm 1.4). O Verbo tornou-se carne! Ansiamos pelo dia quando o nosso corpo e alma serão transformados à semelhança do corpo glorioso de Cristo (“seremos semelhantes a Ele”, 1Jo 3.2; Fp 3.20,21; 1Co 15.49).

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Referências: Crampton, W.G. 2014. Cristo o Mediador: Uma Análise da Cristologia de Westminster. Brasília: Editora Monergismo./ Jones, M. 2018. O Conhecimento de Cristo. Brasília, DF: Editora Monergismo. / Lopes, H.D. 2015. João: As Glórias do Filho de Deus. SP: Hagnos (Jo 1.1-18).