O verdadeiro tesouro



Mateus 13.44-46

 

As parábolas do tesouro escondido e da pérola de grande valor ilustram a resposta sincera que o reino dos céus exige. As analogias dramatizam a suprema importância do reino dos céus e da alegria de encontrá-lo. 

Ambas as parábolas instiga-nos a trocarmos tudo aquilo que considerámos o centro da nossa vida e concentrarmo-nos no reino dos céus (Mt 6.33). Por outras palavras, quem compreender o verdadeiro valor do reino como Jesus o apresenta, trocará alegremente tudo o mais para segui-lo. Assim como os discípulos de Jesus que descobriram o tesouro do reino e deixaram tudo para seguir o Senhor Jesus. 

Esta interpretação está de acordo com tudo o que Jesus sempre ensinou sobre o caminho da salvação (Mc 10.21). Jesus ordenou aos que buscavam a vida eterna que negassem a si mesmos e o seguissem. Suas palavras às multidões, em Marcos 8.34–37, não poderiam ser mais diretas: “Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, tome a sua cruz e siga-me. Quem quiser, pois, salvar a sua vida, perdê-la-á; e quem perder a vida por causa de mim e do evangelho, salvá-la-á. Que aproveita ao homem, ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma? Que daria um homem em troca de sua alma? Em João 12.25, sem deixar nenhuma sombra de dúvida, Jesus afirma: “Quem ama a sua vida perdê-la-á, e quem neste mundo odeia a sua vida, guardá-la-á para a vida eterna”.

Para interpretar as parábolas de Jesus, é necessário ter sempre em consideração determinados princípios hermenêuticos: (1) Não podemos usar uma parábola para interpretar outra. (2) O simbolismo utilizado numa parábola não deve ser levado a extremos. (3) A maioria das parábolas traz uma lição principal - ilustram uma verdade central. 

Por exemplo, não é dito que o campo, nesta parábola, seja o mundo. “O campo é o mundo” (v. 38) aplica-se à parábola do joio. A semente ali semeada ilustra os filhos do reino. Já o campo na parábola do semeador representa um coração cultivado, e a semente é a Palavra. Portanto, as figuras utilizadas não representam as mesmas coisas em todas as parábolas.

Não podemos perder de vista o(s) foco(s) central(ais) da(s) verdade(s) ilustrada(s) numa parábola. Comprar este campo não sugere comprar a salvação e, portanto, não viola a doutrina da graça (Is 55.1; Ef 2.8-9). Em vez disso, a parábola enfatiza o valor supremo do tesouro escondido (o reino dos céus), que vale muito mais do que qualquer “sacrifício” que alguém poderia fazer para adquiri-lo. A parábola, na verdade, nem mesmo trata de “sacrifícios”, já que a pessoa que o encontra recebe um valor muito maior. 

A mensagem da parábola do tesouro escondido (Mt 13.44). No mundo antigo, não havia bancos, cofres ou afins. O procedimento normal para se esconder e proteger objetos de valor era enterrá-los num lugar secreto. A história judaica está repleta de batalhas, cercos, e conquistas dos exércitos inimigos que chegavam para saquear. Josefo, o historiador judeu do primeiro século, escreveu sobre “o ouro e a prata e a mobília preciosa que tinham os judeus, os proprietários escondiam sob a terra, por causa dos destinos incertos da guerra”.

 A parábola não informa como foi que o homem encontrou o tesouro. Talvez tivesse sido contratado pelo dono da terra para cultivá-la, ou talvez passasse casualmente pelo campo, tendo tropeçado numa parte do tesouro que estivesse descoberta, e colocou-o imediatamente no lugar onde o achou. Vendeu, então, tudo o que tinha e comprou o campo para que o tesouro passasse a ser seu.

 Obviamente, este tesouro não pertencia ao dono do campo, pois ele tê-lo-ia escavado e tirado antes de vender a terra. Sem dúvida teria pertencido a algum antigo dono do campo, já morto. Poderia ter ficado ali por várias gerações até que foi descoberto. “As atitudes deste homem demonstram sua honestidade. Ele poderia ter simplesmente levado consigo o tesouro. Ou poderia ter tirado um pouco do tesouro, só o suficiente para comprar o campo. Em vez disso, vendeu tudo o que tinha e comprou todo o campo, de modo que ninguém poderia acusá-lo de haver obtido o tesouro indevidamente” (MacArthur, 2008).

 A mensagem central é a seguinte: Jesus explicou que o reino dos céus é um tesouro pelo qual vale a pena abrir mão de tudo o que se tem. Tudo o que o homem possui não vale nada em comparação ao reino dos céus. 

A mensagem da parábola da pérola de grande valor (13.45-46). Na parábola da pérola de grande valor deparamo-nos com um comerciante especializado no ramo de compra e venda de pérolas. Ao contrário do homem que tropeçou no tesouro escondido (Mt 13.44), esse comerciante procurava diligentemente pelas pérolas excelentes. Mas quando ele encontrou a pérola de grande valor (o reino dos céus), sua reação foi a mesma: ele sacrificou tudo o que tinha e comprou-a (13.45-46).

Mais uma vez, o argumento de Jesus era que aquilo que o homem faz por uma pérola valiosa é exatamente o que o crente deve fazer para ganhar o reino. O reino dos céus vale muito mais do que tudo o que se possa ter. Seu valor excede muito ao dos tesouros deste mundo ou às pérolas mais excelentes. Mesmo assim, a sua riqueza passa despercebida da maioria das pessoas.

 Lições espirituais

  • Tal como o tesouro oculto no campo, multidões passam por ele sem jamais notarem a sua presença. Em 1 Coríntios 2.14, lemos que “o homem natural não aceita as coisas do Espírito de Deus, porque lhe são loucura; e não pode entendê-las porque elas se discernem espiritualmente”.  Então, como alguém pode perceber as realidades do reino? No mesmo capítulo, em 1 Co 2.10, diz: “mas Deus no-lo revelou pelo Espírito.” Deus abre os corações para que compreendam o valor inestimável do seu reino.
  • O homem que achou o tesouro vendeu tudo o que tinha movido por pura alegria (Mt 13.44). Ele alegra-se em desistir de tudo pelo reino. A fé salvadora é assim. O coração que crê rende-se ao Senhor com grande alegria.  Paulo, por exemplo, compreendeu a alegria de desistir de tudo em troca de um ganho maior. Comparado ao tesouro de conhecer a Cristo, tudo o mais, em sua vida, ele considerou como refugo (veja Filipenses 3.7,8).
  • Estas parábolas ensinam que a fé salvadora é uma rendição incondicional, uma disposição para fazer o que quer que seja que o Senhor mandar. Ensinam que o verdadeiro discípulo deixa qualquer coisa que opõe -se a Cristo ou que vier a entrar em competição com Ele (Mt 10.39; 16.25; Lucas 14.25–35). Esse desejo de render-se à autoridade divina é a marca de todo verdadeiro discípulo. É a manifestação inevitável da nova natureza (2 Co 5.17).
  • A salvação é, ao mesmo tempo, gratuita e caríssima. A vida eterna é um dom gratuito (Rm 6.23). Ela foi comprada por Cristo, que pagou o resgate com o seu sangue. Mas isto não significa que não haja um custo no que toca ao impacto da salvação sobre a vida do pecador. A vida eterna causa a imediata morte do ego. “Sabendo isto, que foi crucificado com ele o nosso velho homem” (Rm 6.6). Trata-se de uma troca de tudo o que somos por tudo o que Cristo é.
  • O verdadeiro cristão é o que é, e faz o que faz, por estar totalmente persuadido de que vale a pena. Por outro lado, as pessoas não convertidas são o que são porque não estão plenamente persuadidas de que vale a pena ser diferente. Não querem tomar sua cruz. Não desejam comprometer-se. Não vêm para o lado de Cristo por não estarem convencidas de que esta é a solução. Elas não estão seguras da realidade do “reino do céus”. Eles não estão convencidas de que o “reino” possui tanto valor, um valor que justifique concentrar toda a vida nele (Ryle, 2018). O Senhor Jesus, porém, ensina-nos que não vale a pena tentar ganhar a própria vida e, por fim, perder a vida que realmente importa - a vida eterna.
  • Investidores experientes geralmente não concentram todo o seu dinheiro num único investimento. Mas foi exatamente isso o que ambos os homens destas parábolas fizeram. O primeiro vendeu tudo e comprou um campo; o segundo vendeu tudo e comprou uma pérola. Igualmente, quem realmente crê em Cristo não faz duplos investimentos. O crente verdadeiro assume o compromisso e entrega-se inteiramente a Cristo (Lucas 14.28–31); assim como Moisés, que “considerou o opróbrio de Cristo por maiores riquezas do que os tesouros do Egito, porque contemplava o galardão” (Hb 11.26). Ele abandonou as riquezas do mundo para sofrer por amor a Cristo. Ele trocou o Egito por uma recompensa celestial. Esta é a única atitude que poderá abrir as portas do reino (MacArthur, 2008). Então, você também deseja ter Cristo a qualquer preço? Você já rendeu-se ao senhorio de Cristo? Ele reina em seu coração? Tudo isso acontece quando alguém nasce de Deus. São evidencias da fé salvadora.

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Referências: Carson, D. A. 1984. “Matthew”. (Gaebelein, F. E., ed. The Expositor’s Bible Commentary: Matthew, Mark, Luke, vl. 8 8. Grand Rapids, MI: Zondervan, p. 327-329). / Crossway Bibles, The ESV Study Bible (Wheaton, IL: Crossway Bibles, 2008), 1849. / Lopes, H. D. 2019. Mateus: Jesus, o Rei dos Reis: Comentários Expositivos Hagnos. SP: Hagnos, p. 437–438. / MacArthur, J. 2008. O Evangelho Segundo Jesus. São José dos Campos, SP: Editora FIEL, p. 177–187. / Ryle, J. C. 2018. Meditações no Evangelho de Mateus. São José dos Campos, SP: Editora FIEL, p. 146–148. / Sproul, R. C. 2017. Estudos Bíblicos Expositivos em Mateus. SP: Editora Cultura Cristã, p. 387–392.

 

Leonardo Cosme de Moraes